quarta-feira, 30 de março de 2011

Poema de Vanildo Brito


Na densa noite compacta pesa um grito de milênio
misturado às agonias das derrotas obstinadas.
Em maldição de silêncios as cousas estão fechadas.
Na tristeza mineral de três colunas defuntas
escuros dragões rastejam vomitando treva e sal.

Na densa noite compacta pesa um grito de milênios
e as potestades cansadas de mecânicas sem termo
cospem gemidos e brasas no lugar onde aconteço.

Procurei o olhar dos astros, achei órbitas vazias —
todos os sonhos são mortos na sepultura dos dias.
inúteis as esperanças, inúteis as caminhadas,
inúteis os véus, inúteis as redenções esperadas,
inúteis os campos verdes das primaveras sonhadas,
inúteis os gestos ígneos das magias acordadas.
Um círculo ruim de correntes teceu abismos, teceu
negações por sobre os ventres, pousou nas cousas
                                                                       aladas.

    Onde estão os horizontes, os horizontes que amei?
Certamente além das pontes que eu jamais atravessei.
Sobre ruínas e espantos, por sob a noite das grutas
uma luz tenta nascer e a treva logo a sepulta —
treze palavras de pranto sangram escuras, escuras.

E eu olhando aquilo tudo, nas dimensões encerrado,
arranco meus olhos turvos planto espinhos no meu barro.
Meus pés transformam-se em cascos, minhas mãos tornam-se
                                                                                        garras

    sou demônio irredimido com a pela feita de escamas.
Então dilacero as pragas dos monstros permanecidos,
mastigo carvões e brasas, estrangulo os algarismos,
invento punhais cravados, gozo suplícios noturnos,
torno-me fogo, debruço-me por sobre a cinza dos muros
e cresço tristes vocábulos na carne dos seres mudos.


de  A CONSTRUÇÃO DOS MITOS

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