quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Halloween no Brasil: como conciliar duas culturas na sala de aula?



Halloween no Brasil: como conciliar duas culturas na sala de aula?
Foto: Mauricio Melo

No dia 31 de outubro, algumas escolas brasileiras celebram o Halloween, o Dia das Bruxas. As crianças, principalmente do ensino infantil, vestem fantasias de bruxas, vampiros, fantasmas e outros monstros para comemorar... Comemorar exatamente o quê? A festa, que é popular nos Estados Unidos, chegou às crianças brasileiras por meio de programas televisivos. Os fãs dos Padrinhos Mágicos, LazyTown, Ben 10 e Barney cultivam a brincadeira do doces ou travessuras? nas salas de aulas, muitas vezes sem critérios. Fica a pergunta: em que situação o Halloween pode ser utilizado dentro da escola? Até que ponto é interessante para as crianças participarem de uma manifestação cultural estrangeira?

Comemorar apenas por comemorar, além de, muitas vezes, ocupar o tempo de aulas realmente importantes não acrescenta nada na formação das crianças. Não adianta celebrar uma data na escola que não represente nada para a realidade do estudante. "É preciso explicar como a festa surgiu e contextualizá-la para que os alunos criem uma identificação. Só assim a comemoração fará sentido", diz a professora de inglês do Colégio Augusto Laranja, Cristina Malville Alonso, que trabalha o processo durante todo o mês de Outubro com seus alunos de 4 a 6 anos. Com a ajuda de fotos, vídeos e outros materiais didáticos, ela resgata a história original da data e de seus personagens. As crianças descobrem que a origem do Halloween remete às crenças celtas. Para quem não sabe, este povo da Irlanda acreditava que, no último do verão no hemisfério norte, os espíritos saíam do cemitério para tomar conta dos corpos dos vivos. Aterrorizante, a comemoração pagã, foi condenada na Europa, passando a ser conhecida como Dia das Bruxas. Graças à imigração dos irlandeses para a América, o Halloween se tornou uma data especial nos Estados Unidos.

 

Halloween ou Dia do Saci 


Limitar a comemoração à disciplina de inglês pode ser uma boa alternativa, bem como introduzir, de maneira sutil, a questão da influência de outras culturas graças à imigração e à globalização. Vale também apontar às crianças as diferenças culturais entre os vários países e até, quem sabe, discutir o choque cultural.

Voltar às atenções no mês de outubro para o Dia das Bruxas é realmente um problema. É preciso ter cuidado e lembrar às crianças que, originalmente, esta data não faz parte da nossa história e tradição. Pensando nisso, o Governo do Estado de São Paulo decretou, em 2005, o Dia do Saci, o mesmo dia 31 de outubro. Coincidência? Sem dúvida não, a iniciativa foi uma forma de valorizar a cultura brasileira e tentar coibir a americanização - já que, no imaginário do Brasil, o Saci é um símbolo.

Integrar o inglês com as demais disciplinas, proporcionando discussões que vão além da comemoração do Halloween é uma boa maneira de não enaltecer a data de forma prejudicial. É interessante estudar inicialmente a própria cultura, para depois conhecer as demais. Realizar um projeto sobre o folclore brasileiro aproxima as crianças da cultura brasileira e ajuda a introduzir a questão da americanização. Foi o que fez a professora Cristina: "Trabalhamos muito com interdisciplinaridade e grandes projetos, o mês de agosto é dedicado ao folclore. Com a ajuda de livros sobre lendas colocamos os alunos frente a frente com uma coisa extremamente brasileira e assim os preparamos para conhecer novas culturas", diz.

 

E as escolas bilíngues, como devem se posicionar? 


Como o próprio nome já diz, a escola faz os alunos aprenderem simultaneamente duas línguas, no limite, duas culturas. Priorizando na maioria das vezes o português e o inglês, durante todo o processo de aprendizado é importante que nenhuma das duas seja esquecida, em momento algum. Assim, vale comemorar tanto tradições brasileiras, como as norte-americanas, lembrando sempre de contextualizar e proporcionar novos aprendizados aos alunos. "O contato com outras culturas é importante para a formação de todas as crianças, mas, principalmente, para as que vivem em escolas bilíngues", afirma Adília Torres Cristófaro, coordenadora do Augusto Laranja, unidade Campo Belo, que em 2009 adotou o método das duas línguas no método de ensino.

Para a diretora da unidade Tatuapé do Colégio Santa Amália, Teca Antunes, a comemoração tem sim sua importância, exatamente pelo fato da escola ser bilíngue. "Termos, por princípio, trabalhar com as crianças aspectos culturais do país falante da língua inglesa (e não apenas o idioma). Dentro disso, o Halloween é uma data importante na escola, pois as crianças canadenses têm o costume de brincar nesse dia".

No dia 31, os alunos da Educação Infantil podem vir fantasiadas, já os do Fundamental 1 podem trazer adereços para que todos, no momento de intervalo, brinquem de "trick or treat" ("doces ou travessuras"), trocando doces com os colegas. Apesar de cultuar uma tradição norte-americana, Teca Antunes acredita que as comemorações não são prejudiciais ao aprendizado das crianças. "Hoje, com a globalização, as crianças brasileiras também têm acesso a essas comemorações e isso lhes permite construir conhecimentos a respeito do mundo e da forma como outras crianças, que vivem em outras partes, brincam e divertem-se", diz.

Mesmo assim, a cultura nacional não é descartada, Teca conta que o Saci não deixa de ser apresentado às crianças. "Ele também faz parte da comemoração, juntamente com os símbolos típicos do Halloween. A parte da Cultura Brasileira é garantida, em nossa proposta pedagógica, por meio de aulas específicas que tratam da cultura da infância brasileira: tradições, músicas, cantigas de roda, brincadeiras, poesias, histórias etc."

terça-feira, 30 de outubro de 2012

Biblioteca Nacional completa 202 anos



 
A Biblioteca Nacional comemorou, nesta segunda-feira, 29/10, 202 anos de existência. Uma das dez maiores bibliotecas do mundo e a maior da América Latina segundo a UNESCO, a Biblioteca Nacional funciona diariamente e atende pesquisadores, estudantes e visitantes em geral (a partir do ano passado, passou a abrir também nos finais de semana e feriados para visitas guiadas). Seu acervo de 9 milhões de livros, jornais, revistas, fotografias, documentos e manuscritos, que inclui muitas raridades, abrange mil anos da cultura letrada da humanidade. As visitas orientadas por guias especializados é uma boa maneira de conhecer a história da biblioteca que chegou nas caravelas junto com a corte portuguesa e a arquitetura do prédio-sede construído há um século no centro do Rio. As visitas são grátis e acontecem de segunda a sexta de 10h às 17h, e sábados, domingos e feriados de 12h30 às 16h30. Para passeios especiais ou grupos, é recomendável agendar antes. A Biblioteca Nacional oferece também visitas guiadas em inglês e espanhol. Mais informações pelos telefones (21) 2220-9484 e (21) 3095 – 3881, ou através do e-mail: visiguia@bn.br.

segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Weslley Barbosa no ônibus

A UMA DANÇANTE


(para a amiga Girlayne Tamires - Gigi)

Gi – gira o mundo
Pequeno a teus pés
Gira menina, dançante que és.
A saia rodando
Colorindo o dia
Gira menina e a noite irradia.
Gi – gira girando
Cria asas e voa
Sorria que a vida, dançando é boa.

sexta-feira, 26 de outubro de 2012

Resenha: O menino do dedo verde

por Marcelo Abreu



Antes de começar esta resenha, gostaria de expor uma frustração minha: Como eu gostaria de ter lido esse livro na infância! Acho que teria sido mais mágico e mais memorável.

Infelizmente, o fiz depois de adulto, pois jamais, em anos e anos de vida escolar, encontrei qualquer referência a esta obra de Maurice Druon em outros livros, especialmente os didáticos, que sempre trazem trechos de livros consagrados.

A primeira vez que ouvi falar de O Menino do dedo verde foi quando eu cursava a 8ª série do 1º Grau (atual 9º Ano do Ensino Fundamental). Ele foi recomendado com grande empolgação pelo nosso professor de Língua Portuguesa, o carrasco James, em um de seus poucos momentos de ternura. Sempre cínico e muito exigente com seus alunos, James tornou-se outra pessoa ao mencionar o livro e não deixei de notar essa mudança.

É claro que o procurei pelas livrarias da minha cidade, exaustivamente. Mas não o encontrei, para a minha frustração. Dificilmente encontrávamos bons livros em Manaus. A venda de títulos, até o começo dos anos 90, era focada em livros didáticos e leituras extraclasses obrigatórias adotadas pelas escolas e, aparentemente, O menino do dedo verde parecia não gozar de muito prestígio entre os docentes da época. Uma pena.

Não o encontrando também nas bibliotecas da vida, foi só depois de adulto, lidando com as facilidades do comércio via internet é que consegui ter o livro em mãos. E neste ano, para ser mais específico.

Em seu livro, Maurice Druon narra a história de um garoto chamado Tistu, nascido em berço esplêndido e que vive com seus pais em uma grande mansão, numa cidade fictícia chamada Mirapólvora, famosa por sua indústria bélica, comandada pelo pai do garoto, que sonha ver o filho único seguindo a mesma carreira. Porém, ao entrar na escola da cidade, Tistu acaba revelando-se um fiasco de estudante, por não conseguir adaptar-se às metodologias de ensino aplicadas no local, que lhe parecem constantemente monótonas e inúteis, levando-o ao sono involuntário durante as aulas. E com isso, acaba sendo expulso do local.

Alarmados, e cientes de que a formação intelectual de seu herdeiro não deve ser negligenciada, os pais de Tistu resolvem promover sua instrução de outra maneira, fazendo com que ele aprenda com os próprios olhos, levando-o assim aos locais que eles consideram apropriados ao conhecimento do menino, como o jardim da casa, os campos, os arredores da cidade, a fábrica de canhões, o hospital, considerando assim a vida como a melhor escola que existe.

Mesmo sendo um proeminente intelectual e acadêmico, autor de alguns romances históricos, Druon criou um livro infanto-juvenil perfeito, impregnado de ternura, sensibilidade e poesia que nos fala a respeito da busca de nossas verdadeiras vocações e convicções na figura de um garoto que, no decorrer da história, descobre ter um poder incomum: o ‘dedo verde’, onde tudo o que toca, floresce e frutifica, como se fosse mágica.

Recomendo com entusiasmo a leitura deste livro aos mais jovens. Não deixe que os mesmos vivenciem a mesma frustração que tive até poder finalmente tê-lo em mãos. O menino do dedo verde também é um livro para se ter sempre ao lado, para que, mesmo adultos, possamos relê-lo ao longo dos anos sempre que tivermos uma chance ou quando nos sentirmos desestimulados diante de nossas vidas, pois acredito que a missão desse livro é trazer de volta ao nosso convívio o encantamento pelas coisas novas e a paixão por um mundo mais belo e isento de conflitos. Maurice Druon criou uma obra cujo significado o leitor mais sensível será capaz de introjetar em si, descobrindo-se assim também um possuidor de um polegar verde capaz de revolucionar sua própria existência e o mundo ao seu redor.

Um livro lindo, que através da inocência dos olhos de uma criança, revela a beleza de uma vida feita de bondade, apontando, assim, soluções simples para grandes problemas que os adultos são incapazes de resolver.
 

quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Leia para uma criança

Não gosto de bancos. Todavia, uma vez por ano, o Itaú me faz amá-lo. O banco, pelo terceiro ano consecutivo distribui, gratuitamente, livros infantis maravilhosos. É uma iniciativa digna de reverências. Parabéns aos que criaram o projeto e aos que deram e dão condições de ele acontecer 


 

A Coleção

São três volumes da Coleção Itaú de Livros Infantis para você ler e reler para as crianças. Navegue e conheça um pouco mais sobre cada um deles.
Peça aqui sua coleção

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Sérgio Janma ganha prêmio no RS



Na última sexta-feira, 19, o Auditório Barbosa Lessa, no Centro Cultural CEEE Erico Veríssimo, foi palco para a divulgação dos nomes dos vencedores dos concursos Fotográficos e Literário promovidos pelo Sintrajufe/RS.
Em sua oitava edição, o Concurso Literário Mario Quintana premiou Sérgio Dalício Nascimento da Silva, de João Pessoa (PB), com o primeiro lugar na categoria Conto. Na categoria Crônica, a vencedora foi Tatiana Oliveira Druck, de Porto Alegre. O vencedor na categoria Poesia foi Schleiden Nunes Pimenta, de Campinas (SP).

O primeiro lugar do Concurso Fotográfico, categoria Geral, foi para Jorge Leão, de Porto Alegre. Já na categoria Sintrajufe, o primeiro lugar foi para o colega Gutemberg Ostemberg, do TRF.

O Troféu Palavra Viva 2012 foi dedicado ao escritor e poeta Dilan Camargo, por sua contribuição ao desenvolvimento da literatura no Rio Grande do Sul.

Depois da entrega dos troféus aos selecionados, entre premiados nos três primeiros lugares e menções honrosas, foi oferecido um coquetel.  Durante a confraternização, os presentes escolheram uma das fotografias para ganhar um curso da Escola de Fotografia Câmera Viajante. A imagem escolhida pelo Júri Popular foi clicada por Luciana Soares Perez. 
Os textos selecionados no concurso e os de participantes da Oficina Literária do Sintrajufe/RS farão parte da coletânea “O Fio da Palavra”. A obra tem sessão de autógrafos agendada para o próximo dia 27, às 18h, no Memorial do Rio Grande do Sul, durante a 58ª Feira do Livro de Porto Alegre.
Conheça os vencedores
8º Concurso Literário Mario Quintana
Categoria Conto 


1º lugar - Sérgio Dalício Nascimento da Silva
2º lugar  Caio Henrique Solla
3º lugar  Reginaldo Costa de Albuquerque
Menção Honrosa  Luiz Dias de Vasconcelos
Menção Honrosa  Cleonice de Campos Bourscheid
Menção Honrosa  Tatiana Oliveira Druck

Categoria Crônica 


1º lugar - Tatiana Oliveira Druck
2º lugar - Eduardo Ferreira Moura
3º lugar - Laerte Fernando Levai
Menção Honrosa  Roque Aloisio Weschenfelder

 

Categoria Poesia 

1º lugar -  Schleiden Nunes Pimenta
2º lugar - Carlo Manfroi
3º lugar - Paulo Cezar de Oliveira Tórtora
Menção Honrosa - Rodrigo Ornelas França
Menção Honrosa -André Telucazu Kondo
Menção Honrosa  Cleonice de Campos Bourscheid

8º Concurso Fotográfico
Categoria Sintrajufe


 1º lugar - Gutemberg Ostemberg
2º lugar - Maria Clara Lucena Adams
3º lugar -Miriam Marroni
Menção Honrosa - Marli Isabel Sassi Saraiva
Menção Honrosa - Luciana Soares Perez
Menção Honrosa - Gutemberg Ostemberg
Menção Honrosa - Dênis Ricardo Schor
Menção Honrosa - Denise Bampi



Categoria Geral 


1º lugar - Jorge Leão
2º lugar - Miguel Angelo
3º lugar - Mário Avila de Oliveira
Menção Honrosa - Marcelo Filimberti
Menção Honrosa - José Adilson Rocha da Rosa
Menção Honrosa - Cristiano W. Soares
Menção Honrosa - Carlos Leite Soares

 

Júri Popular -

  Luciana Soares Perez

fonte: http://sintrajufe.tempsite.ws/novo/noticias/noticias_detalhes_site.asp?CodNoticia=8198

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

O SERTÃO DO SER TÃO



Por Wander Shirukaya

 “Tem vida, nome, história, algo que é raro de se ver hoje em dia em tempos de poesia metalinguística”, diz o escritor Astier Basílio sobre a poesia do paraibano Linaldo Guedes. De fato, um dos maiores méritos de Metáforas para um duelo no sertão (Patuá, 2012) está exatamente neste ponto. Nos últimos tempos a produção poética tem se voltado demais à metalinguagem, fato que tem se mostrado o novo lugar comum, zona bastante confortável, pois o poeta não precisa se mostrar, não discute, e pouco transcende os rodeios feitos da poesia sobre poesia. Parece que é hora de mostrar que a poesia que queremos deve ser bem mais do que um cão correndo atrás do próprio rabo. E nesse ato de “dar a cara a tapa” é que o terceiro livro do poeta de Cajazeiras acaba se sobressaindo. 

Metáforas para um duelo no sertão traz uma grande variedade de poemas que, em sua maior parte, se mostram como pequenas narrativas ou retratos da solidão. Para tanto, a imagem do sertão é o foco principal. A impressão que se tem em muitos momentos é a de liberdade, mas uma liberdade conquistada a duras penas, soando serena no que se abre a quem lê, como em “Pote de ouro”: (no fim do arco-íris/o olhar do vaqueiro/ em preto e branco).  Especialmente nos primeiros poemas da compilação, o que se vê é uma expressão do homem sertanejo e de sua lida, temas que podem ser facilmente relacionados ao autor destas obras. Se tal coisa se pouco interessa no aspecto estrutural, por outro lado engrandece a experiência trocada entre autor, obra e leitor, mostrando uma poesia mais preocupada em falar da vida do que falar de si mesma. Não que a metalinguagem não apareça, mas o que predomina é o uso desta a serviço de outros temas e expressões, tal como se vê em “Poesia com T de tédio”: quando soube que minha poesia/ tinha efeitos colaterais/ fechei meus verbos/ rasguei os versos/ e fui ler Olavo Bilac! Sim, a poesia de Linaldo mostra efeitos colaterais, mostra as vísceras e não se esconde em malabarismos tão comuns da poesia hodierna. O bom uso da metalinguagem pode ser visto também em “Da falta de inspiração”, que desloca o tema para uma ambientação erótica sutilmente cafajeste: às vezes/ a dificuldade do poema/ está/ no olhar que não surge// na blusa/ que a musa/ teima em usar.  Por sinal, esse “ar de cafajeste” permeia muito dos poemas, em especial os da segunda metade do livro. Não entendamos aqui o termo como algo pejorativo, tem mais uma conotação jocosa e sacana, consequência do tom veladamente pornográfico utilizado. Tampouco podemos ver os poemas desse grupo como machistas, pois, em sua maior parte, sabiamente nos somos apresentados a um eu-lírico neutro, podendo ser visto por diferentes olhares, independente de sexo ou gênero, como em “Cunilíngua”: coito/ minete/ (ou seria minueto)? [...] quando abre flores e rosas para minha língua.

A grandeza semântica exposta em Metáforas para um duelo no sertão também abre espaço para uma boa disposição estrutural, mas sem muitas novidades. Neste aspecto, chamam mais a atenção os poemas mais concisos, de versos livres, mas não cansativos.   A grande força dos poemas da coletânea ainda parece estar mais na sensibilidade do poeta em criar belas e complexas imagens: com a pele do olfato/ transbordando águas/ entre coxas, buracos e palato: (“Condimento”). O resultado é um trabalho bem equilibrado que mostra toda a maturidade de um bom poeta.
A quem se deparar com esta obra, fica a certeza de textos bastante aprazíveis e de ousadia e coragem. O poeta não anda em círculos, não corre atrás do próprio rabo; uiva uma beleza nostálgica e serena, é leitura que trará boas sensações ao leitor astuto que a buscar.

Wander Shirukaya é escritor paraibano, autor do Blog do Shirukaya (http://blogdoshirukaya.blogspot.com.br/) Este texto foi publicado no site Silêncio Interrompido (http://www.silenciointerrompido.com/).

O livro “Metáforas para um duelo no sertão”, de Linaldo Guedes, pode ser adquirido no site da editora Patuá (www.editorapatua.com.br)

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Monteiro Lobato: formador de leitores

Lobato escrevia porque lia e porque queria ensinar a ler. Lobato foi, nessa ordem, leitor, escritor e formador de leitores.
            (Socorro Acioli. Aula de leitura com Monteiro Lobato).

             por Neide Medeiros Santos  (Crítica literária – FNLIJ/P)


             Aula de leitura com Monteiro Lobato (São Paulo: Biruta, 2012) é a versão revisada e editada da dissertação de mestrado de Socorro Acioli, defendida na Universidade Federal do Ceará – “De Emília à Dona Quixotinha: uma aula de leitura com Monteiro Lobato”.  O prefácio é da lobatóloga Marisa Lajolo que considera importante este trabalho porque ressalta uma das vertentes mais promissoras dos estudos literários – a inclusão da leitura entre seus objetos. 
            O livro está dividido em quatro capítulos assim delimitados: “Personagens leitores”, “Monteiro Lobato: uma vida para leitura”, “A leitura no sitio do Pica-pau Amarelo” e “Emília, leitora de Dom Quixote: um caso de leitura-ação”.
            Monteiro Lobato foi jornalista, crítico, cronista, escritor de livros infantis, romancista, editor e teve forte atuação no mercado editorial brasileiro. Socorro Acioli ressalta o papel inovador de Lobato como editor - criou estratégias eficientes de propaganda e de divulgação dos livros, deu oportunidade a novos escritores e ilustradores, aumentou a rede de vendas de livros no país.
            Nesses comentários ao livro de Socorro Acioli, vamos apresentar, inicialmente, um Lobato leitor, seguindo-se o escritor e, por último, o formador de leitores. 
            Lobato leitor – Na infância, o escritor teve contato com a biblioteca do avô, o Visconde de Tremembé, e foi nesse ambiente mágico que Lobato despertou para a leitura. Em carta a Godofredo Rangel (Barca de Gleyre, vol.1, p.51), Lobato, assim, se expressa:
            “A biblioteca do meu avô era ótima, tremendamente histórica e científica. Merecia uma redoma. [...] Cada vez que naquele tempo me pilhava na biblioteca de meu avô, abria um daqueles volumes e me deslumbrava.”
            Sobre as práticas de leitura, o escritor guardou, entre as lembranças da infância, os momentos em que reunia as irmãs e os filhos dos empregados da fazenda de sua família e passava horas a fio lendo para eles. Este episódio contado por Lobato me conduziu até João Cabral de Melo Neto. No poema narrativo “Descoberta da literatura”, o poeta fala sobre os folhetos de feira que lia para os trabalhadores do engenho de sua família, local onde sempre passava as férias escolares.
             Lobato relembra que leu, na infância, os livros de Júlio Verne e “Robinson Crusoé”, este último foi um presente que recebeu de Natal e foi “lido e relido com um deleite inenarrável”.
            Lobato escritor – O primeiro artigo de Lobato foi publicado em 1896, no jornal O Guarani, organizado pelos alunos do Colégio Paulista em Taubaté, contava 14 anos de idade. O artigo trazia o título “Rabiscando” e era uma crítica ao livro “Enciclopédia do riso e da galhofa”. Trazia a assinatura de Josbem, um dos pseudônimos utilizados pelo escritor.
            Em 1903, aluno do curso de Direito no Largo São Francisco, em São Paulo, fundou o jornal “O Minarete” e publicou vários textos neste jornal. Em 1904, vamos encontrá-lo como colunista do “Jornal de Taubaté”, escrevendo, depois, para muitos outros jornais de São Paulo.
            Em 1920, Lobato lançou seu primeiro livro infantil – A menina do narizinho arrebitado. Este livro foi o início de uma longa série de livros para crianças. Mas Lobato escreveu também para adultos – contos, crônicas, artigos críticos e romances. 
            É na literatura infantil que encontramos o Lobato maior, o escritor querido das crianças e ele reconhece que este era o caminho da salvação quando diz em carta a Godofredo Rangel: “Estou condenado a ser o Andersen dessa terra – talvez da América latina, pois contratei 26 livros infantis com um editor de Buenos Aires”. (Esta carta traz a data de 28 de março de 1943).
            Lobato formador de leitores – Socorro Acioli estabelece comparações entre o educador Edgar Morin e Monteiro Lobato, os dois têm uma visão de mundo semelhante. Tanto para Morin como para Lobato o importante é “formar cidadãos capazes de enfrentar os problemas de seu tempo”. No livro “O poço do Visconde”, o Visconde de Sabugosa estuda geologia para descobrir o petróleo; “Nos Serões de Dona Benta” e em “História das Invenções’, a investigação científica e a pesquisa são estimuladas.
            Vários livros de Lobato dedicados às crianças são analisados pela ensaísta cearense que procura demonstrar a preocupação de Lobato com a formação do leitor.
            Aliado a tudo isso, há destaque para os aspectos técnicos sobre livros, leitura e escrita por meio de esclarecimentos feitos por Dona Benta – explicando o que é prefácio, a diferença entre gente e personagem.
            O último capítulo do livro é dedicado à Emília como leitora de Dom Quixote e a paixão da bonequinha por esse personagem marcante da literatura universal.
            Para o crítico Antonio Candido, “a literatura infantil é talvez a mais difícil de todos os gêneros literários (...) gênero ambíguo, em que o escritor é obrigado a ter duas idades e pensar em dois planos”.
            Monteiro Lobato conseguiu vencer essa barreira – portou-se como um escritor de duas idades - às vezes é um adulto/professor, outras vezes é uma criança que sonha e brinca como criança.

            NOTA LITERÁRIA
          
  AINDA LOBATO

 A obra literária de Monteiro Lobato tem sido objeto de inúmeras discussões, isso desde o tempo da ditadura Vargas. Recentemente, técnicos do MEC questionam: Lobato foi racista? “Caçadas de Pedrinho” deve ser banido dos bancos escolares ou acrescido de algumas informações? No meio dessa polêmica improdutiva, os escritores  – Socorro Acioli (cearense) e Simão Almeida ((paraibano) - publicam livros que valorizam a leitura na obra lobatiana (Acioli) e o papel do jornalista Lobato (Almeida) nos meios culturais brasileiros nas primeiras décadas do século XX. Lobato continua despertando interesse.

(Texto publicado no jornal Contraponto. João Pessoa, 21 de setembro de 2012, B – 4)