domingo, 24 de abril de 2011

Poetas do interior

A partir de hoje, o blog vem com a série Poetas do Interior.

O objetivo é mostrar que a posia sopra onde quer, como disse Murilo Mendes.

Hoje é a vez de Cajazeiras.

Poema de Linaldo Guedes

O sexto personagem

dorian gray com trajes de alferes

diante do espelho não o horror aos próprios vícios mundanos
mas a saudade dos rapapés
e dos escravos
e dos mimos de tia marcolina

duas almas filosofando
sobre a eliminação humana:
never, for ever!- for ever, never

enigmas machadianos espatifados pelo leitor,
sem réplica jacobina.

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Poema de Luis Fernando Mifô

o gigante


Tem dias em que não caibo
nessa cidade de vanguarda.
É estranho, porque quanto mais
ela cresce, menos eu caibo.
¿Como pode essa Física louca
que nenhum Einstein me explica?
Quanto mais ela cresce, menos eu caibo.

Me sinto apertado, incomodado, fustigado.
Tem dias em que sou quase asfixiado
pelos cabos de fibra ótica que servem de varais
nos apartamentos dos estudantes de Medicina.

Se me descuido e viro a cara,
sou capaz de enfiar os olhos num pára-raios.
Se me descuido e piso em falso,
sou capaz de esmagar os carros,
de chutar as estátuas, estilhaçar as vitrines,
de arrastar nos dedos o supermercado,
de dar uma topada na ambulância do SAMU,
de meter os calcanhares no prédio
da Prefeitura e pôr o gabinete do prefeito abaixo.
(assim vou acabar sendo exilado
em pleno estado democrático)

Por isso preciso ter cuidado, muito cuidado!
Preciso dormir bem posicionado,
acordar assaz equilibrado,
atravessar a cidade olhando para os lados,
andar como quem pisa em ovos
e evitar os sapatos para não estragar o asfalto.

Por isso preciso ter cuidado, muito cuidado!
Porque quanto mais essa cidade cresce,
mais me torno um homem desengonçado.

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