Por Neide
Medeiros Santos – Crítica literária FNLIJ/PB
É certo que com a passagem do tempo os contos sempre se
renovam, mas é por isso mesmo que suas raízes devem ser muito antigas [...]. A
base épica da poesia popular assemelha-se
ao verde que se espalha por toda a natureza em múltiplas graduações, que
satisfaz e aclama, sem nunca cansar.
(Jacob e Wilhelm
Grimm. Prefácio à edição original – “Contos maravilhosos infantis e domésticos”).
Natal é tempo de
presente. Para crianças que gostam de
ler e para adultos que guardam a infância do lado esquerdo do peito vai esta sugestão: “Contos maravilhosos
infantis e domésticos” (Tomo I e II. Cosac Naify, 2012).
Os autores desses contos são os irmãos Jacob e Wilhelm
Grimm. A edição da Cosac Naify é especialíssima e não vai nenhum exagero no
superlativo. Oitenta e seis contos estão presentes no Tomo I e setenta no Tomo
II. J. Borges, conhecido xilógrafo pernambucano, foi o responsável pelas
ilustrações. Os contos foram traduzidos por Christine Röhrig, que tem uma longa
experiência na tradução de livros alemães. Marcus Mazzari fez a apresentação.
Há de se destacar, ainda, o prefácio à edição original de Jacob e Wilhelm que
foi incluído no Tomo I e traz as datas de 1810 e 1814.
Discorrer sobre os
cento e cinquenta e seis textos seria tarefa para um livro, assim preferimos
trazer alguns detalhes dos contos dos irmãos Grimm com o objetivo de mostrar a
importância que esses contos desempenham no cenário das letras.
“Os contos maravilhosos infantis e domésticos” foram
recolhidos da tradição oral alemã. Os irmãos Grimm se valeram também de uma
camponesa da aldeia de Zwehrn, perto de Kassel, dotada de uma memória
prodigiosa. Essa senhora contou velhas lendas aos pesquisadores que foram
acrescentadas ao material já coletado.
No prefácio à edição original, Jacob e Wilhelm Grimm reconhecem
que muitas das histórias do livro deitam suas raízes em antigos poemas
heroicos. “A bela adormecida” apresenta estreita ligação com “Brunhilde” dos
nórdicos; “A lenda da pena dourada”, remete à lenda do rei Mark em Tristão.
Quando publicaram os contos, era intenção dos
Grimm que tivessem um caráter educativo
e fossem direcionados às crianças, mas encontraram certa resistência por parte
de alguns educadores – foi levantada a objeção de que havia nos contos uma ou
outra passagem constrangedora, imprópria e indecorosa para crianças. Ninguém se
livra de velha censura! Os irmãos Grimm se defenderam da crítica injusta com
exemplos retirados da natureza: “As flores e as folhas deixam-se crescer com
determinadas cores e formas; a chuva e o orvalho caem como uma boa ação sobre
tudo que se encontra na terra, quem não quiser expor suas plantas por achar que
elas são sensíveis é bom regá-las na sala de estar.” Com essa lição, eles deram
o recado aos educadores retrógrados.
Os Grimm conheceram dezessete edições dos “Contos
maravilhosos infantis e domésticos”. Mediante a intervenção, principalmente de
Wilhelm Grimm, os contos das edições posteriores à de 1812 foram sendo atenuados
no que se refere às passagens de cunho sexual mais explícito. Na edição de
1812, Rapunzel diz a fada que as suas roupas estão muito apertadas, referência
ao estado de gravidez após ter recebido visitas secretas do príncipe. Na edição
de 1819, Wilhelm Grimm substitui o indício de gravidez por uma tênue alusão, e
Rapunzel explica que está ficando cada
vez mais difícil para ela puxar a fada para o aposento em que vive. Felizmente a edição da Cosac Naify foi fiel à
edição de 1812 e não houve nenhum tipo de censura.
Os contos mais conhecidos do público brasileiro se
encontram no Tomo I e citamos, entre outros, “O lobo e os sete cabritinhos”, “Rapunzel”,
“João e Maria”, “A gata borralheira”, “O alfaiate valente”, “O gato de botas”.
“A bela adormecida”, “Barba Azul”.
O crítico Marcus Mazzari observa que são incontáveis os
narradores e poetas alemães que incorporaram às suas obras referências e
alusões aos contos maravilhosos e cita Goethe, Thomas Mann, Günter Grass. Para o crítico brasileiro, a presença dos
Grimm se faz mais forte na obra épica de Günter Grass. No romance, “O tambor de
lata”, Grass encontrou, no “Pequeno Polegar”, uma inspiração decisiva, fato
confessado pelo próprio autor no livro publicado em 2010 – “Palavras de Grimm –
Uma declaração de amor”.
Não poderia deixar de citar escritores brasileiros que
beberam água da fonte dos irmãos Grimm. Na literatura de cordel e na literatura
infantil os exemplos são muitos. O cordelista Manoel Monteiro confessa que leu
muito os contos de Grimm para escrever alguns folhetos. Ricardo Azevedo e Ana Maria Machado fizeram
releituras dos contos de Grimm, até os poetas foram contaminados pelo vírus
desses contos maravilhosos. O poeta paraibano Jairo César se inspirou na
história de Rapunzel para escrever o livro de poesias – “Rapunzel e outros
poemas da infância”.
Eliane Brum, colunista da revista Época, aconselha: se
você viu um bom filme, diga: “Vejam”, se leu um bom livro, diga: “Leiam”. É o
que fazemos: Leiam “Contos maravilhosos infantis e domésticos”
Nenhum comentário:
Postar um comentário