Por Neide Medeiros Santos –
Crítica literária – FNLIJ/PB
Em cima do meu telhado
Pirulin, lulin, lulin,
Um anjo todo molhado
Soluça no seu flautim.
(Mário Quintana.
Canção da Garoa).
“Anjo de Rua” (Recife: Editora Cepe, 2011), livro de
Manoel Constantino com ilustrações do pintor Roberto Ploeg, conquistou em 2011
o 1º. lugar no concurso Cepe de Literatura Infantil e Juvenil e foi finalista
em 2012 do Prêmio Jabuti.
Manoel Constantino é poeta, dramaturgo, jornalista e
ator, nasceu em Alagoas, mas desde os quinze anos que mora em Recife. Roberto
Ploeg nasceu na Holanda e veio para o Brasil estudar Teologia, apaixonou-se
pelo Nordeste e se fixou em Olinda. É artista plástico e já participou de inúmeras
exposições.
A história deste livro teve uma longa gestação. O autor
afirma que esboçou as primeiras ideias há cerca de 11 anos a partir de uma
noticia veiculada no jornal - um menino de rua, após roubar uma bolsa no centro
do Recife, foi jogado no rio por populares e morreu afogado. Essa noticia
chocou o escritor que passou a ter contatos com os meninos de rua, conversando
com eles e procurando saber como viviam o dia a dia. Assim, resolveu transformar
a noticia em um livro juvenil.
O protagonista é Rivaldo, um menino que mora na rua, conhecido
por todos como Careca. No decorrer da narrativa, vamos encontrar vários outros meninos
que circulam e perambulam pelas ruas, fugindo da polícia, dormindo em cima de
caixas de papelão, pedindo esmolas e fazendo pequenos roubos. Essa é a
realidade dos meninos de rua das grandes cidades do Brasil. Se não são
“capitães da areia”, são capitães da miséria.
Rivaldo está com 14 anos, mas quando saiu de casa tinha
apenas nove anos. Ele é o personagem-narrador da história e por seu intermédio
vamos conhecer um pouco da vida dos meninos de rua. Rivaldo já teve casa, pai,
mãe, irmãos e meio-irmãos, resolveu sair de casa depois de apanhar muito do pai
e da mãe. Pouco frequentou a escola, só deu para aprender a contar até 30. Sua
primeira noite na rua foi dolorida. Encontrou uma marquise de um prédio, forrou
o chão de papelão e adormeceu. Acordou de madrugada com chutes no traseiro e
uma voz de homem que dizia:
“– SAI DAÍ, GABIRU! Tá pensando que aqui é suíte de hotel
de luxo? Sai daí, antes que eu chame a polícia.” (2011: p. 23).
Para
sobreviver, Rivaldo começou a fazer cara
de choro, fungar e pedir esmolas sempre com a mesma conversa: tinha perdido a
mãe, era órfão, estava com muita fome e precisava de algum dinheiro para comer.
Algumas vezes a coisa funcionava, ganhava um dinheirinho ou um sanduíche e
enganava a fome.
Um dia encontrou um amigo, um menino mais novo do que
ele, porém muito experiente, chamava-se Chupeta e na companhia de Chupeta
encontrou um lugar mais seguro para dormir – a garagem de um prédio. Na
companhia de Chupeta, Careca dormia sentindo-se mais seguro. O vigia era um
“cara legal”, permitia que meninos de rua dormissem na garagem.
A partir desse dia, estabeleceu-se uma amizade entre
Careca e a turma de Chupeta – Tonhão, Pirulito e Bel, uma menina cheia de
trança, usava sempre um short vermelho, uma morena bem bonita. O coração de
Careca bateu mais forte quando conheceu Bel, foi ficando meio babaca, só tinha
pensamentos para a nova amiga.
A ordem do chefe
Tonhão era para que todos roubassem, isso constrangeu um pouco Careca, mas ordem
de chefe era para ser obedecida, não
adiantava discutir e assim ele viveu a primeira aventura de roubo. Roubou uma
bolsa, mas foi pego e apanhou muito.
De Chupeta, Careca guarda boas lembranças – foi acolhido
por ele na garagem de um prédio, ganhou
do amigo um papagaio bem colorido que voava e ia alto, navegando nas nuvens.
Não gostava de relembrar do desaparecimento do amigo – foi lançado ao rio e tragado
pelas águas do “cão sem plumas”.
Seria “Anjo de rua” um livro de denúncia social?
Literatura engajada? Existe a crítica contra aqueles que poderiam minorar o
sofrimento de crianças abandonadas que perambulam pelas ruas e nada fazem.
Ressalte-se, porém, que o autor soube tratar deste tema com sutilezas literárias
sem cair na denúncia vazia.
Neste livro, destacam-se as ilustrações de Roberto Ploeg
– as expressões sofridas dos meninos de tua, ao ar brejeiro de Bel. A paisagem
pouco aparece, vem representada por um amontoado de casas, verdadeiros cortiços
ou favelas, casas de porta de janelas, todas bem juntinhas.
Foi valiosa a colaboração do artista plástico Roberto
Ploeg que captou muito bem a triste realidade dos anjos de rua. A predominância
dos tons ocres e marrons retrata bem o ambiente de extrema pobreza, apenas o
vermelho do short de Bel e o colorido do papagaio dão um toque de alegria.
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