Mais um da série finalistas do IX Poesia Encenada.
sábado, 30 de junho de 2012
ORAÇÃO DA ESCRITA (PORTUGUESA) [ IX Festival Poesia Encenada do SESC ]
Mais um da série finalistas do IX Poesia Encenada.
sexta-feira, 29 de junho de 2012
100 clássicos literários para download
Lançado em 2004, o Domínio Público é um dos maiores portais de
conteúdo livre para download do mundo. O acervo é composto por obras
em domínio público ou que tiveram seus direitos de divulgação cedidos
pelos detentores legais. No Brasil, os direitos autorais duram setenta
anos contados de 1° de janeiro do ano subsequente à morte do autor. Fiz
uma compilação com 100 obras, entre autores brasileiros e estrangeiros,
escolhidas entre os 10 mil títulos disponíveis no portal. A lista, traz
desde livros seminais, formadores da cultural ocidental, como “Arte
Poética”, de Aristóteles, até o célebre “Ulisses”, de James Joyce,
considerado um dos livros mais influentes do século 20, além de clássicos
brasileiros e portugueses. Entre os livros escolhidos estão “A Divina
Comédia”, de Dante Alighieri; “Don Quixote”, de Miguel de Cervantes;
“Os Lusíadas”, de Luís Vaz de Camões; “A Metamorfose”, de Franz
Kafka; “A Volta ao Mundo em Oitenta Dias”, de Júlio Verne; “Os
Escravos”, de Castro Alves; “Via-Láctea”, de Olavo Bilac; “A Escrava
Isaura”, de Bernardo Guimarães; “Poemas”, de Safo; “Uma Estação no
Inferno”, de Arthur Rimbaud; “O Homem que Sabia Javanês e Outros Contos”,
de Lima Barreto; “Lira dos Vinte Anos”, de Álvares de Azevedo;
“História da Literatura Brasileira”, de José Veríssimo Dias de Matos; “Eu
e Outras Poesias”, de Augusto dos Anjos; “A Esfinge Sem Segredo”, de Oscar
Wilde; “Schopenhauer”, de Thomas Mann; “O Elixir da Longa Vida”, de Honoré
de Balzac; “Cândido”, de Voltaire; “Viagens de Gulliver”, de Jonathan
Swift; “Utopia”, de Thomas Morus; “Canção do Exílio”, de Gonçalves
Dias; “A Carne”, de Júlio Ribeiro; “Os Sertões”, de Euclides da Cunha;
além das principais obras de William Shakespeare, Fernando Pessoa,
Machado de Assis, Florbela Espanca e Eça de Queirós. Para
fazer o download basta clicar sobre o livro selecionado. Para acessar: http://bit.ly/pGpYjD
quinta-feira, 28 de junho de 2012
O vocabulário de Machado de Assis
Machado de Assis foi um dos maiores escritores de todos os tempos. Acho que ninguém discorda disso. Compartilho um link enviado por Ricardo dos Anjos, neto de Augusto, com os passageiros.
Olhem isso: Uma página com os termos mais utilizados pelo escritor. Para
acessar: http://bit.ly/Atjp0J
quarta-feira, 27 de junho de 2012
Toda a obra poética de Fernando Pessoa para download
O portal Domínio Público disponibilizou para download a poesia
completa de Fernando Pessoa. Embora sem uma ordem cronológica adequada e
com edições repetidas, o acervo contempla toda a obra conhecida do poeta
português. Fernando Pessoa nasceu em Lisboa, em junho de 1888, e morreu em
novembro de 1935, na mesma cidade. É considerado, ao lado de Luís de
Camões, o maior poeta da língua portuguesa e um dos maiores da literatura
universal. Seus poemas mais conhecidos foram assinados pelos heterônimos
Álvaro de Campos, Ricardo Reis, Alberto Caeiro, além de um
semi-heterônimo, Bernardo Soares, que seria o próprio Pessoa, um ajudante
de guarda-livros da cidade de Lisboa e autor do “Livro do Desassossego”,
uma das obras fundadoras da ficção portuguesa no século XX. Além de exímio
poeta, Fernando Pessoa foi um grande criador de personagens. Mais do que
meros pseudônimos, seus heterônimos foram personagens completos, com
biografias próprias e estilos literários díspares. Álvaro de Campos, por
exemplo, era um engenheiro português com educação inglesa e com forte
influência do simbolismo e futurismo. Ricardo Reis era um médico defensor
da monarquia e com grande interesse pela cultura latina. Alberto Caeiro,
embora com pouca educação formal e uma posição anti-intelectualista
(cursou apenas o primário), é considerado um mestre. Com uma linguagem
direta e com a naturalidade do discurso oral, é o mais profícuo entre os
heterônimos. São seus “O Guardador de Rebanhos”, “O Pastor Amoroso” e os
“Poemas Inconjuntos”. O crítico literário Harold Bloom, em
entrevista à revista “Época”, afirmou que a obra de Fernando Pessoa é o
legado da língua portuguesa ao mundo. Para acessar: http://bit.ly/ffoF7T
terça-feira, 26 de junho de 2012
O ocaso do maior escritor do século 20
Demência senil impede Gabriel García Márquez de reconhecer familiares e amigos íntimos
García Márquez: demência impede o Nobel de Literatura de escrever (Foto: ) |
Por Marco Lacerda*
O escritor Gabriel García Márquez perdeu definitivamente a memória. Pelo menos esta é a conclusão a que chegaram os meios de comunicação colombianos depois de uma entrevista do autor, terça-feira passada, ao jornalista Plinio Apuleyo, seu amigo íntimo. Depois de duas horas com Gabo, o jornalista revelou que a demência senil já não permite ao escritor escrever e sequer reconhecer familiares e amigos próximos.
“Nas últimas vezes que conversamos pessoalmente, na Cidade do México, ele repetiu várias vezes: ‘Como anda você? O que tem feito? Quando volta de Paris’? Muitos amigos comuns com quem falei sobre o assunto disseram que com eles aconteceu a mesma coisa. Gabo fez as mesmas perguntas. Existe a suspeita de ele tenha algumas fórmulas. Se não reconhece alguém, não pergunta ‘quem é você’?. Prefere fazer perguntas genéricas. Dói muito vê-lo assim. Gabo sempre foi um grande amigo”, disse Plinio Apuleyo.
Há pelo menos cinco anos a deterioração da saúde de García Márquez tornou-se pública. Os primeiros sinais foram dados quando ele renunciou a continuar escrevendo suas memórias (“Viver para contá-la”, primeiro volume de uma trilogia frustrada) e enfrentou a morte de um irmão. Pouco antes o escritor tinha sido vítima de um linfoma do qual saiu intacto.
Em 2007, quando o Congresso do Idioma celebrou em Cartagena de Índias, na Colômbia, os 40 anos da publicação de “Cem anos de solidão”, García Márquez, pai do cineasta Rodrigo García, se deixou ver sorridente e feliz, vestindo um terno de linho branco. Em nenhum momento, porém, falou em público nem concedeu entrevistas. Nesta época surgiram os primeiros rumores sobre os lapsos de memória do Prêmio Nobel de Literatura de 1982.
No mesmo ano, o escritor britânico Gerald Martin escreveu a biografia oficial de Gabo, “Uma vida”, na qual se pode ler, nas entrelinhas, a notícia velada da enfermidade do autor: “Ele era capaz de recordar a maioria das coisas do passado distante, embora tivesse dificuldade em recordar os títulos de seus livros. Mas mantivemos uma conversa normal, até divertida”, diz Martin.
Há um ano, alguns meios de comunicação chegaram a anunciar que Márquez estaria em vias de morrer em Paris. Sua mulher, Mercedes, e sua agente literária, Carmen Balcells, desmentiram a notícia. Gabo não estava em apuros nem estava em Paris. Permanecia em sua casa no México. Há poucos meses a família divulgou uma foto tirada na festa dos 85 anos do autor.
Nos tempos de sua pródiga produção literária Gabriel García Márquez brindou o mundo com uma coleção de obras primas, que o tornaram, na opinião de muitos o maior escritor do século 20. Entre elas se incluem “Ninguém escreve ao coronel”, “Crônica de uma morte anunciada”, “O outono do patriarca”, “O amor nos tempos do cólera”, “Cheiro de goiaba”, “O general em seu labirinto”, “Do amor e outros demônios”, além de uma vasta obra como jornalista e cronista.
Dez frases
“Um único minuto de reconciliação vale mais do que toda uma vida de amizade”.
“O segredo de uma velhice agradável consiste apenas na assinatura de um honroso pacto com a solidão”.
“A sabedoria é algo que, quando nos bate à porta, já não serve para nada”.
“O sexo é o consolo que a gente tem quando o amor não nos alcança”.
“Aprendi que um homem só tem o direito de olhar um outro de cima para baixo para ajudá-lo a levantar-se”.
“Não passes o tempo com alguém que não esteja disposto a passá-lo contigo”.
“Te amo não por quem tu és, mas por quem sou quando estou contigo”.
“Nunca deixes de sorrir, nem mesmo quando estiver triste, porque nunca se sabe quem pode se apaixonar por teu sorriso”.
“Dou valor as coisas, não por aquilo que valem, mas por aquilo que significam”.
“O problema do casamento é que se acaba todas as noites depois de se fazer o amor, e é preciso tornar a reconstruí-lo todas as manhãs, antes do café”.
fonte: http://www.domtotal.com/noticias/detalhes.php?notId=456703
segunda-feira, 25 de junho de 2012
Concentração no mercado editorial brasileiro
A economia de um país é formada por
cadeias produtivas. As cadeias são constituídas por setores. No caso do
livro, os setores são os seguintes: autoral, editorial, gráfico,
produtor de papel, produtor de máquinas gráficas, distribuidor,
atacadista, livreiro, bibliotecário. A interface entre firmas/empresas
de pelo menos dois desses setores forma um mercado. O senso comum para
mercado do livro é constituído pelos setores editorial e livreiro,
intermediado ou não pelo setor distribuidor.
--
Característica importante deste mercado é
a falta de dados atualizados e com elevado grau de confiabilidade sobre
produção, venda e consumo do livro. Desde 1991 a CBL (Câmara Brasileira
do Livro) e o SNEL (Sindicato Nacional dos Editores de Livros)
patrocinam a pesquisa Produção e Vendas do Setor Editorial Brasileiro. A
partir de 2007 a FIPE (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas) da
USP foi contratada e é a responsável pela pesquisa.
Entre novembro de 2010 e abril de 2011 a FIPE realizou a pesquisa O Censo do Livro (dados referentes a 2009). Seguem alguns números: existem no Brasil 498 editoras. A definição de editora é a da UNESCO: edição de pelo menos 5 títulos no ano e produção de 5 mil exemplares.
Com relação ao faturamento anual, temos a seguinte divisão:
231 editoras com faturamento anual até R$ 1 milhão (46,39%);
189 editoras com faturamento anual entre R$ 1 milhão e R$ 10 milhões (37,95%);
62 editoras com faturamento anual entre R$ 10 milhões e R$ 50 milhões (12,45%);
16 editoras com faturamento anual acima de R$ 50 milhões (3,21%).
Portanto, são essas editoras que
disputam o mercado editorial brasileiro, que vem crescendo a cada ano.
Em 2009, o valor total recebido pelas editoras foi de 4,16 bilhões de
reais e, em 2010, aumentou para 4,50 bilhões de reais. Crescimento de 8,12%. Uma
das explicações visíveis para este crescimento é que o valor médio
recebido pelas editoras vem caindo desde 2004. O acumulado está em 34%. O
valor médio recebido em 2009 foi de R$ 13,61 e em 2010 foi de R$
12,94. Portanto, chega-se a um preço de capa médio de R$ 27,22 e R$ 25,88 respectivamente. O livro está com o preço ao consumidor, ao leitor, mais baixo a cada ano.
Esse faturamento tem origem nas vendas para mercado e nas vendas para governo.
Mercado em 2009: 3,25 bilhões de reais (78%);
Mercado em 2010: 3,34 bilhões de reais (74,31%). Crescimento de 2,99%.
Governo em 2009: 916 milhões de reais (22%);
Governo em 2010: 1,15 bilhões de reais (25,69%). Crescimento de 26,32%.
Mas, o que representa o mercado do livro
na economia do país? Os números do PIB são a melhor comparação. O PIB
brasileiro em 2009 foi de 3,143 trilhões de reais. Como o mercado do
livro foi de 4,16 bilhões de reais, este nosso mercado representou
0,13% do PIB. Para 2010 os números foram: PIB 3,675 trilhões de reais.
Mercado do livro de 4,50 bilhões de reais, o que representou 0,12% do PIB.
Outro dado interessante é a relação
livro/habitante. A população do Brasil em 2010 era de 190.755.799
habitantes. Nesse mesmo ano foram vendidos, somente para mercado,
258.697.092 exemplares. Portanto, tem-se a média de 1,36 livro comprado por habitante. Há muito para crescer.
A metodologia da pesquisa divide o mercado em quatro grandes segmentos:
Didáticos
Obras Gerais
Religiosos
CTP – científicos, técnicos e profissionais
Considerando o faturamento total (mercado + governo), temos os seguintes dados:
Segmento
|
2009 fat R$
|
2010 fat R$
|
2009 exs
|
2010 exs
|
Didáticos
|
43,09%
|
46,65%
|
45,35%
|
46,27%
|
Obras Gerais
|
29,93%
|
25,92%
|
31,74%
|
30,88%
|
Religiosos
|
9,66%
|
11,02%
|
16,31%
|
16,92%
|
CTP
|
17,32%
|
16,41%
|
6,59%
|
5,93%
|
Outra característica do mercado é com
relação ao número de lançamentos anuais, isto é, títulos em 1ª edição.
Em 2009 foram 17.183 títulos e, em 2010, 18.712 títulos. Crescimento de
8,90%.
O ano tem 365 dias; excluindo-se 104
dias (sáb e dom) e 12 dias de feriados nacionais, sobram 249 dias. Se
dividirmos o número de lançamentos por esses 249 dias temos a média de
69 novos títulos/dia em 2009, que aumenta para 75 novos títulos/dia em 2010. Livros demais?
Toda essa produção é comercializada através dos seguintes canais, cuja representatividade é:
Ano 2009
|
Canal de comercialização
|
Ano 2010
|
42,44%
|
Livrarias físicas + seu braço e-commerce
|
40,51%
|
23,78%
|
Distribuidores
|
22,55%
|
16,64%
|
Porta-a-porta
|
21,66%
|
82,86%
|
Sub-total
|
84,72%
|
2,91%
|
Supermercado
|
1,47%
|
2,32%
|
Igrejas e templos
|
1,26%
|
1,68%
|
Escolas e colégios
|
1,43%
|
1,41%
|
Editoras direto por e-commerce
|
1,54%
|
8,82%
|
outros
|
9,58%
|
O mercado do livro também acompanha uma
das características da economia mundial: a concentração por meio de
aquisições, fusões e joint-ventures. No Brasil começou pelas editoras,
tanto nacionais quanto estrangeiras. (Não tenho como garantir que o
levantamento abaixo é 100% preciso, mas é próximo disso. A quem tiver
mais informações, agradeço que possam compartilhar).
A Guanabara Koogan (criada em 1932) começou as compras:
1994 a LTC (criada em 1968)
2007 a Forense (criada em 1904)
2007 a Método (criada em 1996)
2008 a Santos (criada em 1981)
2010 a Forense Universitária (criada em 1973)
2011 a EPU (criada em 1952)
2011 a Roca
2011 a AC Farmacêutica (criada em 2005)
Todas essas editoras estão sob a holding GEN – Grupo Editorial Nacional criado em 2007.
A Record (criada em 1942) também foi às compras e fez as seguintes:
1997 a Bertrand Brasil
1997 a Civilização Brasileira
1997 a Difel
2001 a José Olympio
2004 a Best-Seller
2005 joint-venture com a canadense Harlequim Books
2010 a Verus
A Saraiva comprou:
1998 a Atual
2000 a Renascer
2001 a Solução
2003 a Formato
2008 a ARX
2008 a ARX Jovem
2008 a Futura
2008 a Caramelo
A Ediouro comprou:
2002 a Agir
2004 a Relume-Dumará
2005 e 2007 a Nova Fronteira
2006 parceria com a Thomas Nelson
2007 a Nova Aguilar
2008 a Desiderata
A Sextante comprou:
2007 a Intrínseca (50%)
A Artmed comprou:
2009 a McGrae-Hill Education no Brasil
A IBEP/Companhia Editora Nacional comprou:
2010 a Conrad
Com relação às editoras estrangeiras, temos a seguinte cronologia:
Em 1976 a Elsevier (Holanda) entra no mercado nacional em parceria com a Campus. Suas compras foram as seguintes:
2002 a Alegro
2002 a Negócio
2005 a Impetus
Grupo Pearson (Inglaterra) entrou no mercado em 1996 e comprou a Makron Books no ano 2000.
Grupo Vivendi (França), em parceria com o grupo Abril comprou a Ática e a Scipione em 1999. Saiu do Brasil em 2004 e a Abril comprou a sua parte.
Grupo Prisa-Santillana (Espanha) entrou no mercado em 2001 com a compra da Moderna e da Salamandra. Em 2005 comprou 75% da Objetiva.
A Larousse (França) chegou em 2003 e, em 2007, comprou a Escala.
Grupo Planeta (Espanha) chegou em 2003. Em 2006 comprou a Academia da Inteligência.
Edições SM (Espanha) chegou em 2004.
Almedina (Portugal) chegou em 2005.
Penguin Books (USA) em 2005 fez uma joint-venture com a Companhia das Letras e, em 2011, comprou 45% do capital dessa editora.
Grupo Leya (Portugal) chegou em 2009. Em 2010 fez uma parceria com a Barba Negra. Em 2011 comprou a Casa da Palavra.
Thomson Reuters (USA) em 2010 comprou a editora Revista dos Tribunais.
Babel (Portugal) chegou em 2011.
A outra ponta da concentração está no
setor livreiro. O marco divisório aconteceu em 2008 quando a Saraiva
comprou o grupo Siciliano. Atualmente as principais redes de livrarias,
com foco em obras gerais, são:
100 lojas, a Saraiva. Base São Paulo.
Dessas, 46 são megastores. As outras 54 lojas (54%) representam apenas
14% de seu faturamento anual;
32 lojas, a Leitura. Base Minas Gerais;
20 lojas, a Livrarias Curitiba. Base Paraná;
13 lojas, a Cultura. Base São Paulo (abrirá mais 4 lojas ainda em 2012);
11 lojas, a Fnac. Base São Paulo;
7 lojas, a Travessa. Base Rio de Janeiro;
6 lojas, a Livraria da Vila. Base São Paulo (abrirá duas lojas em 2012 e mais 2 em 2013).
Esta concentração nas livrarias de rede
também é facilitada pela migração do comércio em geral para os shoppings
que, como têm um custo elevado para a manutenção de uma loja, viram uma
barreira de acesso para as livrarias como menor capital. No ano 2000 o
Brasil tinha 280 shoppings. Fechou 2011 com 430 shoppings (+ 53,57%).
Em 2012 serão mais 43 e, por enquanto, estão previstos mais 31 para
2013. Para se ter uma ideia da força deste novo local de consumo, de
compras, circulam nos shoppings 376 milhões de pessoas por mês. A população do Brasil é de 191 milhões de pessoas. Impressiona, não?
Não existe uma pesquisa confiável com
relação ao número de livrarias existentes no Brasil. A ANL – Associação
Nacional de Livrarias fez em 2009 um primeiro levantamento através de
questionários enviados a diversos pontos de venda de livros, e chegou
ao número de 2.980 “livrarias”. Livraria para a ANL é “uma empresa que oferece um bom acervo de livros em seu mix de produtos para venda.”
Portanto, essa definição é muito vaga em relação ao censo comum de
livraria. Talvez fosse melhor usar como parâmetro o número de exemplares
no acervo de cada “livraria”. Por exemplo, acervo mínimo de 10% da
produção anual de novos títulos em 1ª edição, o que, em relação à
produção das editoras em 2010, seria de 1.871 exemplares por loja.
No levantamento de 2011 da ANL o número de livrarias chegou a 3.481. Como o país tem 5.564 municípios, além do Distrito Federal, teríamos a média de 0,63 livrarias por município.
É claro que a distribuição dessas livrarias pelo território brasileiro
acompanha a economia e a escolaridade de cada região geográfica. Os
dados são os seguintes:
52,54% das livrarias na região Sudeste;
21,00% das livrarias na região Sul;
16,83% das livrarias na região Nordeste;
6,18% das livrarias na região Centro-Oeste;
3,45% das livrarias na região Norte;
A concentração nos diversos setores da economia do livro avança e fica maior a cada ano. Onde os livros serão vendidos em 2015?
A concentração nos diversos setores da economia do livro avança e fica maior a cada ano. Onde os livros serão vendidos em 2015?
--
Roberto Azoubel,
Assessor I Ministério da Cultura
Representação Regional Nordeste I RRNE
Rua do Bom Jesus, 237 I Bairro do Recife
CEP: 50030-170 I Recife - PE
(81) 31178444 / (81) 97293757
sábado, 23 de junho de 2012
"Com perdão" de Cyelle Carmem
Continuando a série dos poemas finalistas do IX poesia Encenada do Sesc.
Hoje é a vez de Com perdão de Cyelle Carmem, integrante do CAIXA BAIXA.
sexta-feira, 22 de junho de 2012
MANIFESTO POR UMA PARAÍBA LEITORA
O Manifesto por
uma Paraíba Leitora faz parte do Movimento por um Brasil Literário e foi
lançado em 31 de maio de 2012, durante o Encontro de Incidência em
Políticas Públicas da Paraíba, realizado pelo Polo de Leitura na Rede e
objetiva expressar o compromisso da cadeia mediadora de leitura
literária da Região Metropolitana de João Pessoa em expandir o debate a
cerca da importância da leitura e mobilizar esforços para a construção
dos planos municipais e do Plano Estadual do Livro e Leitura do Estado
da Paraíba.
MANIFESTO POR UMA PARAÍBA LEITORA
Ler, um direito de todos
Houve um momento na história
humana em que o conhecimento esteve diretamente relacionado à imediata
necessidade de sobrevivência. Todo o esforço dos indivíduos era canalizado na
perspectiva de conhecer e dominar o espaço, agir sobre ele, de modo a garantir
sua existência, observa Luiz Percival Leme Brito*. Passada essa fase primitiva
da história e garantidos os recursos fundamentais para a sobrevivência, homens
e mulheres se desprenderam do imediato e se lançam na infinda aventura de
indagar as razões de ser, agir e sentir o mundo. As crianças nascem imersas num
mundo fantástico e fantasioso de experimentos e conhecimento, fruto da acumulação
histórica. Seu espírito está imbuído da necessidade de especular sobre a vida e
confrontar os arranjos que a cercam e a norteiam. Desta forma surge a filosofia
cujo interesse é a indagação sobre a existência, a ciência preocupada em
conhecer a organização da matéria, a política centrada na organização coletiva
da sociedade e a arte focada em expressar a condição da existência humana, em
todas as dimensões reais e possíveis, e em tornar-nos capazes, através da
poderosa faculdade da imaginação, de criar os projetos que nos levem adiante no
processo de humanização.
Sem a imaginação, compartida por
todos, não há projeto de futuro melhor. Neste sentido a literatura, como parte
da arte, constitui, na sociedade contemporânea, um dos exercícios fundamentais
de expressão, compreensão, inserção e criação social, não somente capaz de
manifestar as inquietações e percepções do indivíduo e da sociedade real, mas, e
sobretudo, de fazer circular na coletividade, a busca de aperfeiçoamento da
condição humana, a partir da representação e da invenção.
Partindo do princípio de que a
leitura e a escrita são sustentáculos da sociedade contemporânea, condição
imprescindível para a inserção dos indivíduos nos arranjos sociais da
atualidade, e na projeção de um futuro digno, e do fato de que um contingente
expressivo da população brasileira, encontra-se excluído do acesso a esse bem
cultural, o Polo de Leitura na Rede com o apoio do Programa Prazer em Ler,
expressa sua intenção e compromisso de contribuir para a democratização do
acesso ao livro, incidindo na defesa e garantia de políticas públicas de
leitura e estimulando o gosto e a fruição literária a fim de contribuir para a
construção de uma sociedade paraibana de leitores.
Posto que a leitura e a escrita
constituem-se como recursos capazes de melhorar as condições de vida e as
possibilidades de emancipação do indivíduo no mundo, reconhecemos a literatura
como direito básico e fundamental para a formação de todos os cidadãos e
cidadãs brasileiros. Nesta perspectiva, afirmamos nosso compromisso de
sensibilizar, articular e mobilizar forças para a construção do Plano Estadual
do Livro e Leitura (PELL), convocando os distintos segmentos da sociedade civil
paraibana, comprometidos com o processo de criação, produção, circulação e
mediação do livro, o Poder Legislativo Estadual e o Poder Executivo para
estruturar e sancionar a Lei Estadual do Livro do Estado da Paraíba.
Não queremos ser leitores
privilegiados na sociedade. Mas, fazer parte do privilégio de sermos uma
sociedade de leitores.
Contatos: jbenebrito@gmail.com
leituranarede@hotmail.com
José BENEdito de BRITO / Colaboração:
Maria Valéria Rezende
IFPB - João Pessoa, 31 de maio de
2012.
(* Literatura, conhecimento e liberdade, in: Nos caminhos da literatura, Peirópolis, 2008.)
quinta-feira, 21 de junho de 2012
ANDRÉ RICARDO AGUIAR e seu livro novo
ANDRÉ RICARDO AGUIAR está com livro novo na praça. A idade das chuvas saiu pela Editora Patuá. O livro já está disponível para pré-venda no site http://www.editorapatua.com.br/index.php?option=com_content&view=article&id=111&Itemid=55
|
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saiba um pouco sobre André:
André Ricardo Aguiar, autor do livro A idade das chuvas, nasceu em Itabaiana,
Paraíba, em 1969. Publicou, entre outros, os livros de poemas A Flor em
Construção (Editora Ideia, 1992) e Alvenaria (Editora
Universitária/UFPB, 1997). Também é autor de diversos livros infantis e de
crônicas. Participou de revistas, suplementos e antologias, como Correio
das Artes, Jornal Rascunho, Poesia Sempre, Ficções (Portugal) e em
revistas eletrônicas como Zunái, Cronópios, Blecaute e Musa Rara. Além
de eventos literários como Itaú Cultural (SP) e a Flibo (Boqueirão-PB).
É membro-fundador do Clube do Conto da Paraíba e coordenador de projetos de
incentivo à leitura.
|
quarta-feira, 20 de junho de 2012
Poesia paraibana no século XXI: o que vem por ai?
Por Linaldo Guedes
Vês! Ninguém assistiu ao formidável
Enterro de tua última quimera.
Somente a Ingratidão - esta pantera -
Foi tua companheira inseparável!
Acostuma-te à lama que te espera!
O Homem, que, nesta terra miserável,
Mora, entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera.
Toma um fósforo. Acende teu cigarro!
O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
A mão que afaga é a mesma que apedreja.
Se a alguém causa inda pena a tua chaga,
Apedreja essa mão vil que te afaga,
Escarra nessa boca que te beija!
Quando os “Versos Íntimos” de Augusto dos Anjos eclodiram na cena literária brasileira, há exatos cem anos, a Paraíba começou a se tornar conhecida, também, como terra de poetas. Verdade que não foi fácil a absorção da poesia de Augusto dos Anjos por parte da crítica. O poeta paraibano, natural do município de Sapé, só teve sua poesia reconhecida pela crítica após a sua morte, e isso, como lembra o cronista Gonzaga Rodrigues, porque seus versos se tornaram populares perante o público. Ou seja: Augusto primeiro foi reconhecido pelo público para só depois ser aclamado pela crítica.
À propósito dessa tese de Gonzaga Rodrigues, lembro de um episódio ocorrido em meados dos anos 90. Na época, eu integrava um grupo de poesias, intitulado Poecodebar, que se apresentava em bares e circuitos alternativos de João Pessoa. Encenávamos nossos próprios poemas. Numa das nossas apresentações, fomos vaiados constantemente por um senhor que aparentava estar bêbado. Depois de muita perturbação, resolvi provocá-lo e disse ao público que ele era integrante do nosso grupo e que tudo aquilo era combinado. O senhor não se fez de rogado. Subiu à mesa onde nos apresentávamos e recitou justamente “Versos Íntimos”, de Augusto dos Anjos. Na verdade, ele queria ouvir os versos de nosso poeta maior e não os daqueles meninos imberbes metidos à poeta.
O episódio acima apenas ilustra a popularidade de um poeta de linguagem difícil, que construiu uma trilha tão única na poesia brasileira que até hoje não teve seguidores à altura. Augusto dos Anjos foi tão singular que demorou muito tempo após a sua morte para aparecerem autores que poderiam ser chamados de poetas na cena literária paraibana.
O Modernismo, por exemplo, demorou a aportar por aqui. Enquanto em São Paulo e no resto de Brasil se inflamavam as discussões em torno das novas estéticas e propostas literárias lideradas por Oswald de Andrade e outros, na Paraíba as coisas caminhavam a passos de tartaruga. Publicações como A União e Nova Era até divulgavam os ecos modernistas, mas sempre com menções conservadoras, como atesta Hildeberto Barbosa Filho em seu “Arrecifes e Lajedos”, livro fundamental para quem quer conhecer a história da nossa poesia. Hildeberto cita, inclusive, que José Américo de Almeida e Peryllo DOliveira são nomes que foram simpáticos à poesia moderna na Paraíba dos anos 20. “Simpatia, no entanto, moderada, tanto pela formação de cada um quanto pelo contexto, decerto pouco favorável às mudanças”, avalia Hildeberto.
Talvez a influência de Augusto dos Anjos tenha sido um pouco nociva para a poesia paraibana. A herança do soneto bem ao estilo parnasiano durou muitos anos, quase sempre com resultados longe do brilhantismo de um Augusto dos Anjos. A imitação do estilo do poeta do EU também foi uma praxe, que adentrou décadas e séculos de forma ridícula. Pior de tudo: o sucesso da poesia de Augusto dos Anjos fez com que todo mundo achasse que era poeta nesta terra. Isso fez (e faz até hoje) surgirem “poetas” de qualidade duvidosa ou pseudos poetas.
Mas não foi apenas a poesia modernista que não vingou em seu tempo na Paraíba. Outras tendências e autores demoraram a ecoar em terras tabajaras. Como João Cabral de Melo Neto, que só veio explodir com força na poesia de Sérgio de Castro Pinto e do Grupo Sanhauá, já nos anos 60. O Sanhauá, aliás, foi o grande sopro de modernidade na poesia paraibana. Tardiamente, é verdade. Mas, enfim, com o Sanhauá descobrimos que tínhamos poetas de qualidade e não meros epígonos. Além de Sérgio, Marcos Tavares foi outro poeta que se afirmou neste grupo. Antes, a Geração 59 deu uma identidade à poesia paraibana. Ainda influenciada pelas estéticas românticas e parnasianas, a poesia de Vanildo Brito e Jomar Morais Souto tinham, no entanto, tanta qualidade lírica que até hoje continuam sendo referências em nossa tradição poética.
Após o Sanhauá, diversos grupos e poetas foram surgindo e desaparecendo, a maioria deles debutando sempre nas páginas do Correio das Artes. Para não me alongar demais neste introito, cito aqui nomes como Saulo Mendonça, Políbio Alves, José Antônio Assunção, Chico Lino, Edônio Alves, Amador Ribeiro Neto, Lau Siqueira, Astier Basílio, André Ricardo Aguiar e Antônio Mariano. São estes nomes citados, e muitos outros, que mantiveram nossa tradição lírica e vanguardista acesas. Mais do que isso, fizeram a ponte para o embarque das novas gerações no trem da poesia. Aliás, melhor seria falarmos em metrô, já que estamos no século XXI. Mas em nossa terra ainda não tem metrô e isso talvez reflita em nossa poesia, ainda carente de ousadias, ainda devotada, em muitos casos, à influências dos tempos de Augusto dos Anjos.
Com ou sem ousadias, o certo é que nossa tradição lírica se renova e novos nomes já começam a aparecer. E o grupo Caixa Baixa tem contribuído decisivamente para essa renovação. Do final do ano passado para início deste 2012, o grupo tem ocupado espaços na literatura paraibana, participando de eventos, organizando outros e lançando livros. São autores dos mais diversos rincões do estado que, graças às facilidades do mundo virtual, interagem prosa e poesia. Nem tudo que é reluz é ouro, claro. Há deficiências na produção literária de alguns componentes do grupo e às vezes parece que a qualidade bate palmas para a quantidade. Mas alguns nomes já merecem referências e devem ser olhados de forma mais atenta.
É o caso de Thiago Lia Fook, na minha avaliação o poeta mais resolvido literariamente falando do grupo. Nascido em Campina Grande, Thiago é graduado em Direito pela UEPB e tem Mestrado em Ciências Jurídicas pela UFPB. Publicou o livro “Poesia natimorta e versos sobreviventes”, pela editora Bagagem em 2010 e contos e poemas em sites e revistas na internet.
Thiago tem uma poesia onde o domínio do verso parece bem mais presente, em comparação com os demais colegas do grupo. Chega a render tributo a Mário Quintana e outros poetas, mas com dicção própria, sem procurar ser plágio de suas próprias influências. Habitante das margens do Igapé, Thiago estreou bem em livro e pode integrar tranquilamente o índice da nova literatura paraibana. Como faz ver no poema “Súmula”:
“explosões de gases
nos corpos do céu
e da terra...
.............luzeiros
.............que nascem
.............buracos
.............que mordem
.............a alma?
.............assumas
.............foram atingidas
.............pelas faíscas”
Outro poeta do grupo Caixa Baixa que merece destaque é Bruno Gaudêncio, autor de dois livros é um poeta que investe um pouco mais na tradição lírica-erótica com bons resultados, como mostra no poema “Acaso Caos”, cheio de indagações, indagações essas que afirmam seus versos:
“o caos que existe em nós
não faz a cama,
mas abre as portas,
as pernas…
o acaso não liberta,
mas deixa a chama,
a chave,
na porta…
na pele.
acaso o caos
não é o cobertor?
a madeira que divide
os nossos corpos
na hora do sexo?”
Também de Campina Grande, Bruno nasceu em 1985. Graduado em jornalismo e história, publicou “O Ofício de Engordar as Sombras” e Cântico Voraz do Precipício”, este último de contos. Bruno Gaudêncio é um dos idealizadores do Caixa Baixa, assim como Jairo Cézar.
Autor de “Escritos no ônibus”, vencedor de prêmio literário promovido pela Funjope, Jairo tem uma poesia que paga tributo às tradições orais dos cordelistas e cantadores de viola. Admirador confesso de Augusto dos Anjos, conseguiu não deixar que a poesia do autor do EU influenciasse em sua produção. Este ano, Jairo lançou “Rapunzel e outros poemas de infância” e surpreendeu a crítica com um livro muito bem construído. Curiosamente, sua poesia cresce mais na linguagem feita para o público infantil. Um exemplo é o resumo poético que Jairo consegue para a história de Pinóquio:
“O menino disse
Que a menina ouviu
Que de tanto dizer a verdade,
O nariz do Pinóquio sumiu!”
Ou a dos três porquinhos:
“Palha, madeira ou tijolo?
Onde será que mora o lobo?”
Concisão e talento acima da média para recriar poeticamente histórias de nosso imaginário infantil.
Mas a poesia paraibana do século XXI não se resume ao Caixa Baixa. Há nomes e nomes que trilham caminhos individuais e tendências estéticas diferentes.
É o caso de Eunice Boreal, artista multimídia que ultiliza diversos suportes para exercitar a poesia. Desenvolve projetos em teatro, curta metragem, música, performance, videoart, desenho, pintura, instalações e poemas. Conheci Eunice como atriz, mas depois descobri uma poeta antenada com as novas tendências tecnológicas, mas sem abrir mão do lirismo, a raiz de toda tradição poética. Com bacharelado em Filosofia, é natural que a poesia de Eunice tenha questionamentos filosóficos. Mas sua poesia também abusa, no bom sentido, da ironia, da concisão métrica e da contestação rebelde que deve alimentar cada geração. É o caso do poema “Eco depois de um mês em 68”, onde ela diz:
“Nós cansamos do velho
da intrépida múmia
com mofo aromático
E desespero tétrico.
Mas nunca do clássico
Pois esse não envelhece
Ganha a voz com o vento
E no tempo permanece.
Nós cansamos do que se basta
O que se rende à casta
Temem o que vem e se temem
Nunca se olham nem se desentendem
Nunca se afirmam e nem surpreendem.
Nós inventamos o futuro
E engolimos o modernismo
Nós devoramos a vanguarda
E transcendemos o partidarismo
mas isso,
é só
porque nascemos depois
que nasceu o pluralismo”.
Por fim, incluo neste sumário da novíssima geração o poeta Daniel Sampaio. Também advogado, Daniel não lançou livro, mas tem poemas publicados em antologias lançadas no Brasil e em Portugal. De todos os autores aqui citados, é o que mais radicaliza o diálogo com as vanguardas, a exemplo do concretismo e da poesia inventiva que vingou no início deste século. Este diálogo, entretanto, é feito de forma consciente, com o cuidado e a valorização que a linguagem poética há de sempre exigir. Diálogo que também é feito com solos de rock’n’roll ou árias de óperas. Neste sentido, transcrevo aqui a série de perfis publicados por Daniel Sampaio na revista eletrônica Zunái:
1.
O cigarro entre os dedos faz cair
cinzas sobre o prato
alumínio e flexível do almoço do dia.
Mas a fome não dejeta
o desejo do vício.
Ao contrário, ela despeja
uma tensão nos intestinos
do faminto que agora come
com as mãos sujas
de um trago pra lugar nenhum.
2.
A intenção do tiro
lhe passar as têmporas
adoça o tempo que lhe resta.
Sabe ser a vida
o segundo de silêncio
antes da estopa da roupa
ensaguentar-se.
Como um Werther, o vinho
entornado sobre a mesa,
risca o dedo para sonar a vida
e o doce rumor do nada.
3.
Espera ao pé do lixo
a vez de ser chamado.
Segura a ficha entre os dedos
polegar e indicador
de traços magros, pele
ressecada e rugosa como
figo seco e estragado.
À frente há o espelho
das janelas contra o
rosto de horto e pétalas
em pedaços de calcário.
Mas está em desconforto,
e não percebe o reflexo
do ramalhete de corvos.
Sua vez, no entanto,
não será agora. Antes
dele, aquela Senhora”.
Daniel Sampaio, Eunice Boreal, Jairo Cézar, Bruno Gaudêncio e Thiago Lia Fook são apenas algumas sugestões de nomes para serem lidos e questionados na nova poesia paraibana. Todos tem poesia (ainda em construção, é verdade) e estofo literário para crescer e fermentar novas linguagens e novos versos. São poetas com estilos diferentes, embora de uma mesma geração, o que é ótimo. E também são autores que provocam e colocam o dedo na ferida em questões chaves da literatura. Enfim, são os autores que vão escrever a nova poesia paraibana. Ou não! Vai depender deles, claro.
(Texto que proferi em mesa redonda do evento “Literando Culturas: do regional ao universal”, no I Encontro de Literatura da UVA, sábado, dia 9 de junho, no Teatro do Sesi, em João Pessoa)
do blog: http://linaldoguedes.blog.uol.com.br/
terça-feira, 19 de junho de 2012
PMJP lança ‘I Concurso de Vídeo Poema Augusto dos Anjos’ em homenagem ao poeta
O prefeito de João Pessoa, Luciano Agra, abriu oficialmente no último dia 6 de junho as comemorações pelo centenário da publicação do livro
‘Eu’, do poeta paraibano Augusto dos Anjos. Uma solenidade foi realizada
pela Prefeitura Municipal de João Pessoa (PMJP), na Associação
Paraibana de Letras (APL), na Capital, para celebrar a data e marcar o
anúncio do I Concurso de Vídeo Poema Augusto dos Anjos, que irá premiar
produções em várias categorias, incluindo a participação de alunos da
rede municipal de ensino.
“A Prefeitura de João Pessoa não poderia ficar ausente das
comemorações pelos cem anos do lançamento do livro ‘Eu’ de Augusto dos
Anjos, que foi escolhido há 12 anos pela população paraibana como a
personalidade mais importante do Estado no século 20, acima de
políticos, empresários e outras artistas reconhecidos nacionalmente.
Outros eventos em torno do centenário do livro serão promovidos pela
gestão com a proposta de resgatar ainda mais o nome e a obra deste
poeta”, destacou o prefeito Luciano Agra em seu discurso para membros da
APL.
Concurso - O I Concurso de Vídeo Poema Augusto dos
Anjos teve edital lançado quarta (6), pela Fundação Cultura João
Pessoa (Funjope) e receberá inscrições no período de 13 de julho a 10 de
outubro deste ano. O concurso premiará trabalhos em cinco categorias:
paraibano, nacional, regional Nordeste, universitário e escolas da rede
municipal de ensino. As premiações serão de R$ 10 mil, R$ 8 mil, R$ 5
mil, R$ 3 mil e um laptop, respectivamente, em relação às categorias. O
resultado final será apresentado no dia 15 de dezembro.
“Os vídeos poderão ser apresentados em qualquer linguagem com duração
máxima de cinco minutos, e
deverão ser escritos sobre Augusto dos Anjos ou sobre algumas de suas obras ou o conjunto da obra”, explica o diretor executivo da Funjope, Lúcio Vilar.
O presidente da Academia Paraibana de Letras, o jornalista e escritor
Gonzaga Rodrigues, destaca que a realização do novo concurso pela PMJP
irá contribuir de forma significativa para que mais paraibanos possam
conhecer a obra de quem foi considerado um dos maiores poetas
brasileiros.
“Augusto dos Anjos é um poeta consagrado e que a partir dessa
linguagem audiovisual também vai poder ser conhecido por um maior número
de pessoas. Apesar de ter escrito em uma linguagem pouco acessível, o
ritmo e a magia de seus poemas encantaram o povo paraibano, que o elegeu
o Paraibano do Século 20”, ressaltou.
segunda-feira, 18 de junho de 2012
III Concurso Cepe de Literatura Infantil e Juvenil
A Companhia Editora de Pernambuco (Cepe) abre inscrições para o III
Concurso Cepe de Literatura Infantil e Juvenil, ao qual poderão
concorrer brasileiros e estrangeiros legalizados, residentes no
território nacional, de qualquer idade. Os textos da modalidade Infantil
são destinados a leitores de seis a 10 anos de idade e os da modalidade
Juvenil são para adolescentes entre 11 e 16 anos. Os interessados
poderão se inscrever nas duas modalidades de premiação. Os prêmios serão
de R$ 8 milpara o primeiro colocado de cada categoria; R$ 5 mil para o
segundo e R$ 3 mil para o terceiro. A comissão julgadora será composta
de cinco membros, entre especialistas em literatura infantojuvenil e
profissionais das áreas de educação e cultura. O regulamento está
disponível no site da editora (http://www.cepe.com.br/index.php/sobre-a-cepe/regulamentos)
domingo, 17 de junho de 2012
Alexandre Chaúque e Domi Chirongo lançam livro em Maputo
O Conselho Municipal da Cidade de Maputo e a Associação de Escritores Moçambicanos tem a honra de convidar ao lançamento dos livros Ndekeni, de Alexandre Chaúque, e Nau Nyau e Outras Sinas, de Domi Chirongo, a ter lugar no dia 19 de Junho de 2012, pelas 16h, no Átrio do Conselho Municipal da Cidade de Maputo. As duas obras foram vencedoras do Prémio Municipal 10 de Novembro, em 2010 (Domi Chirongo) e 2011 (Alexandre Chaúque).
Entrada Livre.
sábado, 16 de junho de 2012
IX Poesia Encenada do Sesc - PB - Poema O Carpinteiro
Com este vídeo, inicio uma série de postagens com os participantes do IX Poesia Encenada.Festival que une literatura e teatro sob o mesmo teto. Este ano, o evento aconteceu nos dias 1,2, e 3 de junho, no belo Theatro Santa Roza.
O vídeo de hoje, é do poema O Carpinteiro. Texto que fiz especialmente para o festival. No próximo sábado, tem mais!
sexta-feira, 15 de junho de 2012
A alegoria em Augusto dos Anjos
Por Chico Viana
Antes de
enfocar as representações alegóricas em Augusto dos Anjos, devemos precisar o
sentido com que, neste trabalho, designamos o termo alegoria.
Etimologicamente, alegoria significa “outro discurso”; do ponto de vista
retórico, ela consiste numa espécie de metáfora sucessiva, encadeada, onde
vários objetos ou conceitos no plano real aludem a idêntica seqüência no plano
figurado, ou poético. Lausberg a conceitua como uma “metáfora continuada como
tropo do pensamento” , ressaltando que, na alegoria, um pensamento é
substituído por outro, com o qual está ligado por uma relação de semelhança.
João Adolfo Hansen distingue dois tipos de alegoria – uma que ele chama de construtiva, ou retórica, e outra interpretativa ou hermenêutica . Enquanto a primeira constitui uma “técnica metafórica de representar e personificar abstrações”, a segunda, também chamada de “alegoria dos teólogos”, é antes um modo de interpretar os textos sagrados. Como tal, liga-se à hermenêutica sagrada; antes de ser expediente transfigurador do discurso, ela existe para sancionar um sentido prévio, absoluto, que em última instância a explica.
Das duas acepções do termo alegoria, interessa-nos obviamente a primeira. Ou seja, a alegoria como expediente retórico, caracterizado pela transposição contínua do sentido próprio no figurado. Dentro dessa conceituação genérica, centraremos nosso interesse num tipo especial de alegoria – o que foi praticado pelo barroco. Pois a ele, conforme demonstraremos, vincula-se grande parte dos procedimentos retórico-poéticos presentes em Eu e outras poesias.
Enquanto manifestação barroca, a alegoria se opõe ao símbolo e reflete a crise do sujeito após o período renascentista. Durante a Renascença prevaleceram, como se sabe, os ideais clássicos consubstanciados no humanismo greco-latino, do qual o símbolo era a típica representação. Suas características eram a clareza, a brevidade, a graça e a beleza. O símbolo era breve e claro porque representava “a idéia em sua forma sensível, corpórea” ; se o corpo podia traduzir o espírito, era porque a natureza, e com ela o homem, não se percebia culpada. O “símbolo plástico”, do qual o melhor exemplo é a escultura grega, traduz o acordo entre essência e natureza, alma e corpo; segundo Creuzer, citado por Walter Benjamin, ele reflete o momento em que “a essência não aspira ao excessivo, mas, obediente à natureza, adapta-se à sua forma, penetrando-a e animando-a” .
Esse acordo se quebra por força do pecado original. Devido a ele, o homem arrasta a natureza em sua queda, instaurando-se então a inconciliável dualidade corpo x alma. Correspondendo ao domínio do natural e do decaído, o corpo humano não pode mais representar um ideal de harmonia e beleza. E a essência, que antes nele se continha, perdendo o seu correspondente sensível, vai aspirar ao desmedido, ao excessivo. Nessa estética do desmedido e do excessivo, que caracteriza a alegoria, consiste a arte barroca. O excesso decorre do sentimento de desacordo, de diferença, cuja matriz foi a nossa primeira transgressão. Conforme nos lembra Rouanet, “...O saber do alegorista é um saber culpado. Ele quer salvar a criatura, embora saiba que ela é culpada, por causa do pecado original.” .
O excesso é, de fato, um elemento característico da estética barroca. Percebido como “ultrapassagem de um limite” , ele traduz a quebra da harmonia e do rigor que caracterizam o contorno, isto é, a medida pela qual se define a representação oposta, ou clássica. O barroco ou neobarroco, conforme nos ensina Omar Calabrese, é uma época da cultura “ ... em que (...) o prazer ou a necessidade é (...) tender para o limite e provar o excesso” , com vistas à contestação de um valor ou grupo de valores.
Culpa, excesso, desejo de construir uma nova ordem são marcas da poesia de Augusto dos Anjos, conforme procuramos demonstrar em nossa Tese, hoje livro, O evangelho da podridão . Nosso propósito agora não é investigar a melancolia do poeta, como então fizemos, mas apontar algumas imagens que, constituindo-se em representações alegóricas, vinculam-no à estética barroca.
Augusto um barroco? Um barroco fora de época? Ora, antes de ser um momento histórico datado, o barroco é uma ocorrência que se repete ao longo do tempo. Sarduy o define como “uma atitude generalizada e uma qualidade formal dos elementos que o exprimem” e reconhece, nessa perspectiva, que “...pode haver barroco em qualquer época da civilização” .
Conforme nos demonstra Walter Benjamin, melancolia e barroco se correspondem. O olhar barroco é também, como o olhar melancólico, dilacerado pela culpa. O melancólico, segundo nos instrui Freud, recrimina-se pela perda do objeto – e o barroco, pela visão e o reconhecimento de tudo o que, na história, é “prematuro, sofrido e malogrado”. No plano da representação barroca ou alegórica, marcado pela melancolia, a história se confunde com a natureza e aparece como “figuração de ruínas”; conforme observa Sérgio Paulo Roaunet, “...para construir a alegoria, o mundo tem de ser esquartejado. As ruínas e fragmentos servem para criar a alegoria” .
A representação alegórica, pois, constitui uma estética de fragmentação e de ruptura. O alegórico não persegue o harmônico, o sublime, o proporcionado; ele se volta para as coisas, para os objetos, que visa resgatar. E os resgata, justamente, constituindo-os em alegorias. É pela transfiguração alegórica que os objetos, por assim dizer, se salvam. Enquanto fragmentos, eles indiciam uma totalidade perdida, da qual o artista é nostálgico e que só se reconstitui no plano da beleza, ou seja, por intermédio da sublimação – já que, pela sublimação, o objeto adquire uma espécie de transcendência, scende a uma forma de absoluto. No caso de Augusto dos Anjos, a nostalgia da totalidade, ou mais propriamente da Unidade perdida, reveste-se de uma obsessão mística e se torna patente, por exemplo, na angústia com que ele procura “esse danado Numero Um/ que matou Cristo e que matou Tibério”.
Tentemos sumariamente apontar alguns exemplos de alegoria no poeta paraibano. Dentre as imagens por que ela se manifesta, destaquemos as que enfatizam a obsessão pela morte, a fratura do significante e, para usar uma expressão de Julia Kristeva, a “desconstituição da matéria” , já que o melancólico tende a projetar na natureza, nas coisas, a dissolução dos seus elos psíquicos.
A obsessão pela morte é um traço característico do alegorista. Segundo Walter Benjamin, “... a alegorização da physis só pode consumar-se em todo o seu vigor no cadáver.” . E Rouanet observa que “... a morte é o conteúdo mais geral da alegoria barroca; (...) o esquema básico do alegorista é transformar o vivo no morto.” . É próprio dele ver nos objetos as ruínas, e nas pessoas, a imagem do “cadáver potencial” que todos somos. E somos cadáveres potenciais porque a morte já está inscrita em nossas vidas, comprometendo-as desde o início. O olhar melancólico jamais se alheia dessa lúgubre evidência.
Augusto dos Anjos refere a obsessão com a morte em vários de seus textos, nos quais são visíveis tanto a recusa ao erotismo quanto a fixação no cadáver em que iremos nos transformar. Em “Apóstrofe à carne”, por exemplo, o eu lírico diz que, “ao (pegar) nas carnes do (seu) rosto/ (Sente) o fim da orgânica batalha:/– Olhos que o húmus necrófago estraçalha,/ Diafragmas, decompondo-se ao sol posto...” . Em “Mistérios de um fósforo”, escreve que “... (vê), como nunca outro homem viu,/ Na anfigonia que me produziu/ Noniliões de moléculas de esterco.” (p.176) . E adiante, no mesmo poema, remata: “... eu vejo enfim, com a alma vencida,/ Na abjeção embriológica da vida/ O futuro de cinza que me aguarda!”.
Um dos exemplos típicos de alegoria barroca está nestes versos de Cristoph Männling, que vê o mundo como “uma grande loja/ Um posto aduaneiro da morte/ Em que o homem é a mercadoria que circula/ A morte, a extraordinária negociante,/ Deus, o contador consciencioso,/ E a sepultura, um armarinho e armazém credenciado.” . Sem nunca ter possivelmente lido o poeta alemão, Augusto dos Anjos quase repete um dos termos dessa imagem, ao afirmar que “a morte .../ é a alfândega, onde toda a vida orgânica/ Há de pagar um dia o último imposto!” (p. 100). “Posto aduaneiro” em um, “alfândega” em outro – efeito de sombrias afinidades eletivas. Em ambos, a mesma idéia de que o imposto da vida é a morte, e de que esse ninguém vai conseguir sonegar. Melhor aceitá-lo, afeiçoar-se a ele, conforme o eu lírico de “Último credo”, que diz amar o coveiro, “ – este ladrão comum/ que leva a gente para o cemitério.” (p. 90).
Se o homem evolui para a morte, o corpo marcha para se transformar em esqueleto – em caveira. Daí outro traço característico do olhar alegórico, que é transpor a superfície corporal e se concentrar nas vísceras ou, sobretudo, nos ossos. Estes constituem o espólio a que a morte nos reduz. O esqueleto é concreção, limite, estágio último da “ultrafatalidade de ossatura” a que estamos submetidos; a personagem do soneto “Decadência” constata que, após haver perdido tudo, “... Só lhe restam agora o último dente/ E a armação funerária das clavículas!” (119). Esse tipo de representação envolve também o corpo feminino, cuja sensualidade exacerba a culpa do melancólico; Gustave Flaubert chega a confessar: “...A contemplação de uma mulher nua me faz sonhar com o seu esqueleto.” (14). E o próprio Augusto descarna o corpo da meretriz, radiografando-lhe o ato sexual na irônica e grotesca imagem que se segue: “Nesse espolinhamento repugnante/ O esqueleto irritado da bacante/ Estrala... Lembra o ruído harto azorrague/ A vergastar ásperos dorsos grossos./ E é aterradora essa alegria de ossos/ Pedindo ao sensualismo que os esmague!”. (p. 192).
Outro dos recursos usados por Augusto dos Anjos é a fragmentação do significante. Através dela, ressalta-se “... o princípio dissociativo e pulverizador, que está na base da concepção alegórica” . Julia Kristeva observa que o estrato fônico é particularmente adequado a traduzir as rupturas que, como inscrições intrapsíquicas, refletem o trabalho da pulsão de morte. O alegórico fratura o corpo da palavra, transferindo à corporeidade lingüística os estilhaçamentos de que, na sua ótica, é feito o corpo do mundo. Com o barroco, através da alegoria, a linguagem é levada antes a significar do que a comunicar. E a significação se consegue, basicamente, com a “antítese” entre som e sentido; com o excesso de forma interferindo, saturando o que se quer dizer. A poética de Augusto dos Anjos, conforme defendemos em nossa Tese, está marcada por um excesso de representação fonossemântica.
Através sobretudo das aliterações e das sinéreses, Augusto tensiona ao máximo a articulação fônica. Observe-se, no exemplo seguinte, como os grupos consonantais em /r/ parecem reproduzir o movimento dos ossos que dançam: “Os esqueletos desarticulados,/ Livres do acre fedor das carnes mortas/ Rodopiavam com as brancas tíbias tortas/ Numa dança de números quebrados!” (p. 72). Neste outro, onde ele acusa a chegada do “Filósofo Moderno”, a angustiante monotonia infernal nos é sugerida, ou reforçada, pelo excesso de fonemas /e/: “Aí vem sujo, a coçar chagas plebéias,/ Trazendo no deserto das idéias/ O desespero endêmico do inferno...” (p. 52). No exemplo seguinte, ainda, o afã lúbrico e pecaminoso do sátiro parece intensificar-se através da consoante gutural; a sua sensualidade “...Lembra a fome incoercível que escancara/ A mucosa carnívora dos lobos.” (p. 54).
Tratemos, para finalizar, das imagens de desconstituição da matéria. Em Augusto dos Anjos, elas em grande parte se inserem no domínio da doença, que parece acometer a matéria orgânica e inorgânica. Lacan nos lembra que o gosto pelo mórbido é característico do universo da falta; no contexto de Eu e outras poesias, as imagens que projetam a fragmentação no mundo natural, exterior, não são senão reflexos de um desmoronamento interior, o qual reflete a tirania do superego. O que primordialmente se desconstitui é a unidade psíquica do eu lírico, cujo estilhaçamento se reflete no corpo (como doença) e no mundo – no corpo do mundo, também este doente.
É no bojo de tais cortes que, ao símbolo, sucede a alegoria – a figura por excelência da ruptura e da crise. Atentando nas articulações simbólicas do processo, Julia Kristeva relaciona a fragmentação com o abandono do “Absoluto do Sentido” . A melancolia barroca ou moderna, segundo outra estudiosa francesa, “...nasce nessa grande cesura histórica dos séculos dezesseis e dezessete, onde a língua perde as suas referências ontológicas...” . Reduzida a um “molambo”, “paralítica” (para referir outra imagem de nosso poeta, no soneto “A idéia”) a língua não mais diz o ser. Estamos, pois, diante de uma crise do homem em face do Ser Absoluto, com o qual os elos, necessariamente simbólicos, foram cortados. Daí se vê que o barroco não se opõe apenas à Antiguidade greco-latina; opõe-se também à própria visão de mundo medieval, onde esses liames de alguma forma eram mantidos.
As imagens de doença e destruição disseminam-se ao longo de toda obra de Augusto dos Anjos. Destaquemos dois significativos exemplos: no final de “As cismas do Destino”, a impressão geral é de paralisia e desalento. Observe-se a referência ao “mecanismo moribundo” a que se reduz um mundo sem “teleolologia” ou transcendência. Observe-se também como as referências à “Natureza”, ao “ludíbrio” e ao “luto” parecem vincular esse quadro à nossa culpa primordial, de que se deseja uma espécie de purificação pelo fogo: “O mundo resignava-se invertido/ Nas forças principais do seu trabalho.../ A gravidade era um princípio falho,/ A análise espectral tinha mentido!// O Estado, a Associação, os Municípios/ Eram mortos. De todo aquele mundo/ Restava um mecanismo moribundo/ E uma teleologia sem princípios.// Eu queria correr, ir para o inferno,/ Para que, da psiquê no oculto jogo,/ Morressem sufocadas pelo fogo/ Todas as impressões do mundo externo!// Mas a Terra negava-me o equilíbrio.../ Na Natureza, uma mulher de luto/ Cantava, espiando as árvores sem fruto,/ A canção prostituta do ludíbrio!”.
No final de “Os doentes” também se percebe, num primeiro momento, o mesmo clima de destruição. A ruína, o cansaço, a doença generalizada relacionam-se estreitamente com a culpa, segundo se depreende da referência a um céu “vingador”; se há vingança, é que houve ofensa, agravo, falta: “Um céu calamitoso de vingança/ Desagregava, déspota e sem normas,/ O adesionismo biôntico das formas/ Multiplicadas pela lei da herança!// A ruína vinha horrenda e deletéria/ Do subsolo infeliz, vinha de dentro/ Da matéria em fusão que ainda há no centro,/ Para alcançar depois a periféria!// Contra a Arte, oh! Morte, em vão teu ódio exerces!/ Mas, a meu ver, os sáxeos prédios tortos/ Tinham aspectos de edifícios mortos/ Decompondo-se desde os alicerces!// A doença era geral, tudo a extenuar-se/ Estava. O Espaço abstrato que não morre/ Cansara... O ar, que em colônias fluidas, corre,/ Parecia também desagregar-se!” (p. 111).
Segundo Omar Calabrese, comentando a estética neobarroca, “... qualquer ação ou indivíduo excessivo quer pôr em causa uma ordem qualquer, talvez destruí-la, ou construir outra nova.” . Augusto dos Anjos é um bom exemplo desse princípio geral e daí se firma como um remanescente barroco. Em seus torneios excessivos, alegóricos, através dos quais “deforma” a linguagem, ele rejeita a nossa transgressão primeira, o pecado original, e fantasia o emergir de um homem novo. Uma das passagens que melhor ilustram atitude é sem dúvida o final de “Os Doentes”, onde às imagens de destruição sucedem-se estes versos, de renovação e esperança: “O letargo larvário da cidade/ Crescia. Igual a um parto, numa furna,/ Vinha da original treva noturna,/ O vagido de uma outra Humanidade!// E eu, com os pés atolados no Nirvana,/ Acompanhava, com um prazer secreto,/ A gestação daquele grande feto,/ Que vinha substituir a Espécie Humana!” (112).
João Adolfo Hansen distingue dois tipos de alegoria – uma que ele chama de construtiva, ou retórica, e outra interpretativa ou hermenêutica . Enquanto a primeira constitui uma “técnica metafórica de representar e personificar abstrações”, a segunda, também chamada de “alegoria dos teólogos”, é antes um modo de interpretar os textos sagrados. Como tal, liga-se à hermenêutica sagrada; antes de ser expediente transfigurador do discurso, ela existe para sancionar um sentido prévio, absoluto, que em última instância a explica.
Das duas acepções do termo alegoria, interessa-nos obviamente a primeira. Ou seja, a alegoria como expediente retórico, caracterizado pela transposição contínua do sentido próprio no figurado. Dentro dessa conceituação genérica, centraremos nosso interesse num tipo especial de alegoria – o que foi praticado pelo barroco. Pois a ele, conforme demonstraremos, vincula-se grande parte dos procedimentos retórico-poéticos presentes em Eu e outras poesias.
Enquanto manifestação barroca, a alegoria se opõe ao símbolo e reflete a crise do sujeito após o período renascentista. Durante a Renascença prevaleceram, como se sabe, os ideais clássicos consubstanciados no humanismo greco-latino, do qual o símbolo era a típica representação. Suas características eram a clareza, a brevidade, a graça e a beleza. O símbolo era breve e claro porque representava “a idéia em sua forma sensível, corpórea” ; se o corpo podia traduzir o espírito, era porque a natureza, e com ela o homem, não se percebia culpada. O “símbolo plástico”, do qual o melhor exemplo é a escultura grega, traduz o acordo entre essência e natureza, alma e corpo; segundo Creuzer, citado por Walter Benjamin, ele reflete o momento em que “a essência não aspira ao excessivo, mas, obediente à natureza, adapta-se à sua forma, penetrando-a e animando-a” .
Esse acordo se quebra por força do pecado original. Devido a ele, o homem arrasta a natureza em sua queda, instaurando-se então a inconciliável dualidade corpo x alma. Correspondendo ao domínio do natural e do decaído, o corpo humano não pode mais representar um ideal de harmonia e beleza. E a essência, que antes nele se continha, perdendo o seu correspondente sensível, vai aspirar ao desmedido, ao excessivo. Nessa estética do desmedido e do excessivo, que caracteriza a alegoria, consiste a arte barroca. O excesso decorre do sentimento de desacordo, de diferença, cuja matriz foi a nossa primeira transgressão. Conforme nos lembra Rouanet, “...O saber do alegorista é um saber culpado. Ele quer salvar a criatura, embora saiba que ela é culpada, por causa do pecado original.” .
O excesso é, de fato, um elemento característico da estética barroca. Percebido como “ultrapassagem de um limite” , ele traduz a quebra da harmonia e do rigor que caracterizam o contorno, isto é, a medida pela qual se define a representação oposta, ou clássica. O barroco ou neobarroco, conforme nos ensina Omar Calabrese, é uma época da cultura “ ... em que (...) o prazer ou a necessidade é (...) tender para o limite e provar o excesso” , com vistas à contestação de um valor ou grupo de valores.
Culpa, excesso, desejo de construir uma nova ordem são marcas da poesia de Augusto dos Anjos, conforme procuramos demonstrar em nossa Tese, hoje livro, O evangelho da podridão . Nosso propósito agora não é investigar a melancolia do poeta, como então fizemos, mas apontar algumas imagens que, constituindo-se em representações alegóricas, vinculam-no à estética barroca.
Augusto um barroco? Um barroco fora de época? Ora, antes de ser um momento histórico datado, o barroco é uma ocorrência que se repete ao longo do tempo. Sarduy o define como “uma atitude generalizada e uma qualidade formal dos elementos que o exprimem” e reconhece, nessa perspectiva, que “...pode haver barroco em qualquer época da civilização” .
Conforme nos demonstra Walter Benjamin, melancolia e barroco se correspondem. O olhar barroco é também, como o olhar melancólico, dilacerado pela culpa. O melancólico, segundo nos instrui Freud, recrimina-se pela perda do objeto – e o barroco, pela visão e o reconhecimento de tudo o que, na história, é “prematuro, sofrido e malogrado”. No plano da representação barroca ou alegórica, marcado pela melancolia, a história se confunde com a natureza e aparece como “figuração de ruínas”; conforme observa Sérgio Paulo Roaunet, “...para construir a alegoria, o mundo tem de ser esquartejado. As ruínas e fragmentos servem para criar a alegoria” .
A representação alegórica, pois, constitui uma estética de fragmentação e de ruptura. O alegórico não persegue o harmônico, o sublime, o proporcionado; ele se volta para as coisas, para os objetos, que visa resgatar. E os resgata, justamente, constituindo-os em alegorias. É pela transfiguração alegórica que os objetos, por assim dizer, se salvam. Enquanto fragmentos, eles indiciam uma totalidade perdida, da qual o artista é nostálgico e que só se reconstitui no plano da beleza, ou seja, por intermédio da sublimação – já que, pela sublimação, o objeto adquire uma espécie de transcendência, scende a uma forma de absoluto. No caso de Augusto dos Anjos, a nostalgia da totalidade, ou mais propriamente da Unidade perdida, reveste-se de uma obsessão mística e se torna patente, por exemplo, na angústia com que ele procura “esse danado Numero Um/ que matou Cristo e que matou Tibério”.
Tentemos sumariamente apontar alguns exemplos de alegoria no poeta paraibano. Dentre as imagens por que ela se manifesta, destaquemos as que enfatizam a obsessão pela morte, a fratura do significante e, para usar uma expressão de Julia Kristeva, a “desconstituição da matéria” , já que o melancólico tende a projetar na natureza, nas coisas, a dissolução dos seus elos psíquicos.
A obsessão pela morte é um traço característico do alegorista. Segundo Walter Benjamin, “... a alegorização da physis só pode consumar-se em todo o seu vigor no cadáver.” . E Rouanet observa que “... a morte é o conteúdo mais geral da alegoria barroca; (...) o esquema básico do alegorista é transformar o vivo no morto.” . É próprio dele ver nos objetos as ruínas, e nas pessoas, a imagem do “cadáver potencial” que todos somos. E somos cadáveres potenciais porque a morte já está inscrita em nossas vidas, comprometendo-as desde o início. O olhar melancólico jamais se alheia dessa lúgubre evidência.
Augusto dos Anjos refere a obsessão com a morte em vários de seus textos, nos quais são visíveis tanto a recusa ao erotismo quanto a fixação no cadáver em que iremos nos transformar. Em “Apóstrofe à carne”, por exemplo, o eu lírico diz que, “ao (pegar) nas carnes do (seu) rosto/ (Sente) o fim da orgânica batalha:/– Olhos que o húmus necrófago estraçalha,/ Diafragmas, decompondo-se ao sol posto...” . Em “Mistérios de um fósforo”, escreve que “... (vê), como nunca outro homem viu,/ Na anfigonia que me produziu/ Noniliões de moléculas de esterco.” (p.176) . E adiante, no mesmo poema, remata: “... eu vejo enfim, com a alma vencida,/ Na abjeção embriológica da vida/ O futuro de cinza que me aguarda!”.
Um dos exemplos típicos de alegoria barroca está nestes versos de Cristoph Männling, que vê o mundo como “uma grande loja/ Um posto aduaneiro da morte/ Em que o homem é a mercadoria que circula/ A morte, a extraordinária negociante,/ Deus, o contador consciencioso,/ E a sepultura, um armarinho e armazém credenciado.” . Sem nunca ter possivelmente lido o poeta alemão, Augusto dos Anjos quase repete um dos termos dessa imagem, ao afirmar que “a morte .../ é a alfândega, onde toda a vida orgânica/ Há de pagar um dia o último imposto!” (p. 100). “Posto aduaneiro” em um, “alfândega” em outro – efeito de sombrias afinidades eletivas. Em ambos, a mesma idéia de que o imposto da vida é a morte, e de que esse ninguém vai conseguir sonegar. Melhor aceitá-lo, afeiçoar-se a ele, conforme o eu lírico de “Último credo”, que diz amar o coveiro, “ – este ladrão comum/ que leva a gente para o cemitério.” (p. 90).
Se o homem evolui para a morte, o corpo marcha para se transformar em esqueleto – em caveira. Daí outro traço característico do olhar alegórico, que é transpor a superfície corporal e se concentrar nas vísceras ou, sobretudo, nos ossos. Estes constituem o espólio a que a morte nos reduz. O esqueleto é concreção, limite, estágio último da “ultrafatalidade de ossatura” a que estamos submetidos; a personagem do soneto “Decadência” constata que, após haver perdido tudo, “... Só lhe restam agora o último dente/ E a armação funerária das clavículas!” (119). Esse tipo de representação envolve também o corpo feminino, cuja sensualidade exacerba a culpa do melancólico; Gustave Flaubert chega a confessar: “...A contemplação de uma mulher nua me faz sonhar com o seu esqueleto.” (14). E o próprio Augusto descarna o corpo da meretriz, radiografando-lhe o ato sexual na irônica e grotesca imagem que se segue: “Nesse espolinhamento repugnante/ O esqueleto irritado da bacante/ Estrala... Lembra o ruído harto azorrague/ A vergastar ásperos dorsos grossos./ E é aterradora essa alegria de ossos/ Pedindo ao sensualismo que os esmague!”. (p. 192).
Outro dos recursos usados por Augusto dos Anjos é a fragmentação do significante. Através dela, ressalta-se “... o princípio dissociativo e pulverizador, que está na base da concepção alegórica” . Julia Kristeva observa que o estrato fônico é particularmente adequado a traduzir as rupturas que, como inscrições intrapsíquicas, refletem o trabalho da pulsão de morte. O alegórico fratura o corpo da palavra, transferindo à corporeidade lingüística os estilhaçamentos de que, na sua ótica, é feito o corpo do mundo. Com o barroco, através da alegoria, a linguagem é levada antes a significar do que a comunicar. E a significação se consegue, basicamente, com a “antítese” entre som e sentido; com o excesso de forma interferindo, saturando o que se quer dizer. A poética de Augusto dos Anjos, conforme defendemos em nossa Tese, está marcada por um excesso de representação fonossemântica.
Através sobretudo das aliterações e das sinéreses, Augusto tensiona ao máximo a articulação fônica. Observe-se, no exemplo seguinte, como os grupos consonantais em /r/ parecem reproduzir o movimento dos ossos que dançam: “Os esqueletos desarticulados,/ Livres do acre fedor das carnes mortas/ Rodopiavam com as brancas tíbias tortas/ Numa dança de números quebrados!” (p. 72). Neste outro, onde ele acusa a chegada do “Filósofo Moderno”, a angustiante monotonia infernal nos é sugerida, ou reforçada, pelo excesso de fonemas /e/: “Aí vem sujo, a coçar chagas plebéias,/ Trazendo no deserto das idéias/ O desespero endêmico do inferno...” (p. 52). No exemplo seguinte, ainda, o afã lúbrico e pecaminoso do sátiro parece intensificar-se através da consoante gutural; a sua sensualidade “...Lembra a fome incoercível que escancara/ A mucosa carnívora dos lobos.” (p. 54).
Tratemos, para finalizar, das imagens de desconstituição da matéria. Em Augusto dos Anjos, elas em grande parte se inserem no domínio da doença, que parece acometer a matéria orgânica e inorgânica. Lacan nos lembra que o gosto pelo mórbido é característico do universo da falta; no contexto de Eu e outras poesias, as imagens que projetam a fragmentação no mundo natural, exterior, não são senão reflexos de um desmoronamento interior, o qual reflete a tirania do superego. O que primordialmente se desconstitui é a unidade psíquica do eu lírico, cujo estilhaçamento se reflete no corpo (como doença) e no mundo – no corpo do mundo, também este doente.
É no bojo de tais cortes que, ao símbolo, sucede a alegoria – a figura por excelência da ruptura e da crise. Atentando nas articulações simbólicas do processo, Julia Kristeva relaciona a fragmentação com o abandono do “Absoluto do Sentido” . A melancolia barroca ou moderna, segundo outra estudiosa francesa, “...nasce nessa grande cesura histórica dos séculos dezesseis e dezessete, onde a língua perde as suas referências ontológicas...” . Reduzida a um “molambo”, “paralítica” (para referir outra imagem de nosso poeta, no soneto “A idéia”) a língua não mais diz o ser. Estamos, pois, diante de uma crise do homem em face do Ser Absoluto, com o qual os elos, necessariamente simbólicos, foram cortados. Daí se vê que o barroco não se opõe apenas à Antiguidade greco-latina; opõe-se também à própria visão de mundo medieval, onde esses liames de alguma forma eram mantidos.
As imagens de doença e destruição disseminam-se ao longo de toda obra de Augusto dos Anjos. Destaquemos dois significativos exemplos: no final de “As cismas do Destino”, a impressão geral é de paralisia e desalento. Observe-se a referência ao “mecanismo moribundo” a que se reduz um mundo sem “teleolologia” ou transcendência. Observe-se também como as referências à “Natureza”, ao “ludíbrio” e ao “luto” parecem vincular esse quadro à nossa culpa primordial, de que se deseja uma espécie de purificação pelo fogo: “O mundo resignava-se invertido/ Nas forças principais do seu trabalho.../ A gravidade era um princípio falho,/ A análise espectral tinha mentido!// O Estado, a Associação, os Municípios/ Eram mortos. De todo aquele mundo/ Restava um mecanismo moribundo/ E uma teleologia sem princípios.// Eu queria correr, ir para o inferno,/ Para que, da psiquê no oculto jogo,/ Morressem sufocadas pelo fogo/ Todas as impressões do mundo externo!// Mas a Terra negava-me o equilíbrio.../ Na Natureza, uma mulher de luto/ Cantava, espiando as árvores sem fruto,/ A canção prostituta do ludíbrio!”.
No final de “Os doentes” também se percebe, num primeiro momento, o mesmo clima de destruição. A ruína, o cansaço, a doença generalizada relacionam-se estreitamente com a culpa, segundo se depreende da referência a um céu “vingador”; se há vingança, é que houve ofensa, agravo, falta: “Um céu calamitoso de vingança/ Desagregava, déspota e sem normas,/ O adesionismo biôntico das formas/ Multiplicadas pela lei da herança!// A ruína vinha horrenda e deletéria/ Do subsolo infeliz, vinha de dentro/ Da matéria em fusão que ainda há no centro,/ Para alcançar depois a periféria!// Contra a Arte, oh! Morte, em vão teu ódio exerces!/ Mas, a meu ver, os sáxeos prédios tortos/ Tinham aspectos de edifícios mortos/ Decompondo-se desde os alicerces!// A doença era geral, tudo a extenuar-se/ Estava. O Espaço abstrato que não morre/ Cansara... O ar, que em colônias fluidas, corre,/ Parecia também desagregar-se!” (p. 111).
Segundo Omar Calabrese, comentando a estética neobarroca, “... qualquer ação ou indivíduo excessivo quer pôr em causa uma ordem qualquer, talvez destruí-la, ou construir outra nova.” . Augusto dos Anjos é um bom exemplo desse princípio geral e daí se firma como um remanescente barroco. Em seus torneios excessivos, alegóricos, através dos quais “deforma” a linguagem, ele rejeita a nossa transgressão primeira, o pecado original, e fantasia o emergir de um homem novo. Uma das passagens que melhor ilustram atitude é sem dúvida o final de “Os Doentes”, onde às imagens de destruição sucedem-se estes versos, de renovação e esperança: “O letargo larvário da cidade/ Crescia. Igual a um parto, numa furna,/ Vinha da original treva noturna,/ O vagido de uma outra Humanidade!// E eu, com os pés atolados no Nirvana,/ Acompanhava, com um prazer secreto,/ A gestação daquele grande feto,/ Que vinha substituir a Espécie Humana!” (112).
Bibliografia
ANJOS, Augusto dos. Eu, outras poesias e poemas esquecidos. Texto e nota
de Antônio Houaiss. Rio de Janeiro: São José, 1971.
BENJAMIN, Walter. Origem do drama barroco alemão. Tradução, apresenta-
ção e notas por Sérgio Paulo Rouanet. São Paulo: Brasiliense, 1984.
CALABRESE, Omar. A idade neobarroca. Lisboa: Edições 70, 1987. (Arte
& Comunicação).
HANSEN, João Adolfo. Alegoria: construção e interpretação da metáfora.
São Paulo: Atual, 1986. (Série Documentos).
MAGAZINE LITTÉRAIRE; Littérature e mélancolie (dossier). N. 244,
juillet-août 1987.
VIANA, Chico. O evangelho da podridão: culpa e melancolia em Augusto
dos Anjos. João Pessoa: UFPB/Editora Universitária, 1994.
do site : www.chicoviana.com
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