A música perdida
De repente ouvi uma música. Seu som
encontrou meus ouvidos como quem procura morada e, por mais que eu
evitasse, tentasse dar a entender que não era comigo, ela se acendia
indiscutivelmente maior dentro de mim. Tive medo de nunca mais ouvi-la,
de perdê-la, que ela fosse levada pelo vento, que escapasse de mim
através de meus poros e nunca mais retornasse.
Comecei a sentir sua alma, a me
concentrar em adivinhar seus acordes. Ela vinha de longe, de um lugar
que eu não sabia ainda onde era. E eu descalça, na chuva, à noite, me
coloquei a segui-la.
Ela me levou para o mar. Meus olhos
nublaram e ao longe avistei um farol em um mar que tempesteava muito.
Nas dependências da torre do farol um homem ao piano executava uma
sequência que tinha acabado de compor. Ele tocava suave… E aquela canção
era a que agora eu tinha por dentro.
Continuei a ouvi-la, até que as ondas
fizeram a torre ceder. Eu a vi cair, desmanchar, a luz do farol apagar,
tudo virar silêncio… Como se nunca tivesse acontecido música alguma.
Como se eu conseguisse esquecer.
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