Por Natália
O pai dizia que ela seria médica. A mãe apostava na área de exatas, a avó sonhava com ela num convento - um absurdo, diziam os tios, ela pode conseguir um bom dote. Matricularam no xadrez, inglês, alemão e piano clássico. Rebeca queria férias, sempre riam desse pedido. Menina, você não entende nada disso. Logo cedo Rebeca aprendeu falar apenas quando lhe perguntassem algo, mas só queriam saber das notas, nem seus horários ela escolhia. Quando Rebeca abria a boca, as vozes aumentavam. Em dezembro, foi fazer caridade na Bahia, atendendo os caprichos da avó. Quando Rebeca viu o mar, descobriu a felicidade. Decidiriam que já estava na hora de namorar. Encontraram um herdeiro rico, bonitinho, burro feito uma porta. Perfeito. Rebeca exclamou, gritou, suplicou. Assustados, disfarçaram o pânico com desprezo. Desde quando Rebeca fala? Quem a ensinou falar? Riram, mandaram ela calar a boca bonito. Rebeca queria voltar pro seu amor, o mar. Não deixaram. Ela deveria casar logo. Pela primeira vez Rebeca se ofendeu. Sentiu raiva, revolta, medo, culpa. Chovia. Ela saiu pro meio da rua, pro meio do mundo, dançar na chuva. Quis se conhecer. Quem sou eu? - se perguntava, não sabia, mas se sentia bem na tempestade. Foi encontrada molhada, está louca - diziam. É o demônio, gritava a avó. Choveu insultos, Rebeca não se importou. Estava dentro de si. No outro dia muita tosse. Rebeca era um incômodo. Tanto trabalho para uma decepção dessas. Depois de algumas semanas, hospital. Pneumonia. Rebeca se foi. Fácil assim, por um pouco de chuva. Antes de ir, Rebeca monossilabou... SHH fizeram. Rebeca só queria um copo d'água.
Natália edita o blog : http://caleidoscopiomiope.blogspot.com/
PS: e ela só tem 17 anos.
Adorei, a coitadinha da Rebeca, pô!
ResponderExcluirMuito bom texto. Natália, eu adoro o teu jeito de escrever, as imagens que constrói. Não sei explicar, só sei que é boa tua narrativa, e divertida! rs
Parágrafos curtos e boa capacidade narrativa. Natália vai longe.
ResponderExcluirBrigada! é muito surpreendente ter uma resposta tão linda assim, pricipalmente de vocês. De repente uma coisa que fiz por acaso se torna algo bom e colorido. Graças a vocês, que confesso que se tornaram meu combustível-verbal. Vocês, ah, são minha inspiração.
ResponderExcluirO espaço é seu, menina.
ResponderExcluirabraço