Por Wander Shirukaya
“Tem vida, nome, história, algo que é raro de
se ver hoje em dia em tempos de poesia metalinguística”, diz o escritor Astier
Basílio sobre a poesia do paraibano Linaldo Guedes. De fato, um dos maiores
méritos de Metáforas para um duelo no sertão (Patuá, 2012) está exatamente
neste ponto. Nos últimos tempos a produção poética tem se voltado demais à
metalinguagem, fato que tem se mostrado o novo lugar comum, zona bastante
confortável, pois o poeta não precisa se mostrar, não discute, e pouco
transcende os rodeios feitos da poesia sobre poesia. Parece que é hora de
mostrar que a poesia que queremos deve ser bem mais do que um cão correndo
atrás do próprio rabo. E nesse ato de “dar a cara a tapa” é que o terceiro
livro do poeta de Cajazeiras acaba se sobressaindo.
Metáforas
para um duelo no sertão traz uma grande variedade de poemas que, em sua maior
parte, se mostram como pequenas narrativas ou retratos da solidão. Para tanto,
a imagem do sertão é o foco principal. A impressão que se tem em muitos
momentos é a de liberdade, mas uma liberdade conquistada a duras penas, soando
serena no que se abre a quem lê, como em “Pote de ouro”: (no fim do arco-íris/o
olhar do vaqueiro/ em preto e branco). Especialmente nos primeiros poemas
da compilação, o que se vê é uma expressão do homem sertanejo e de sua lida,
temas que podem ser facilmente relacionados ao autor destas obras. Se tal coisa
se pouco interessa no aspecto estrutural, por outro lado engrandece a
experiência trocada entre autor, obra e leitor, mostrando uma poesia mais
preocupada em falar da vida do que falar de si mesma. Não que a metalinguagem
não apareça, mas o que predomina é o uso desta a serviço de outros temas e
expressões, tal como se vê em “Poesia com T de tédio”: quando soube que minha
poesia/ tinha efeitos colaterais/ fechei meus verbos/ rasguei os versos/ e fui
ler Olavo Bilac! Sim, a poesia de Linaldo mostra efeitos colaterais, mostra as
vísceras e não se esconde em malabarismos tão comuns da poesia hodierna. O bom
uso da metalinguagem pode ser visto também em “Da falta de inspiração”, que
desloca o tema para uma ambientação erótica sutilmente cafajeste: às vezes/ a
dificuldade do poema/ está/ no olhar que não surge// na blusa/ que a musa/
teima em usar. Por sinal, esse “ar de cafajeste” permeia muito dos
poemas, em especial os da segunda metade do livro. Não entendamos aqui o termo
como algo pejorativo, tem mais uma conotação jocosa e sacana, consequência do
tom veladamente pornográfico utilizado. Tampouco podemos ver os poemas desse
grupo como machistas, pois, em sua maior parte, sabiamente nos somos
apresentados a um eu-lírico neutro, podendo ser visto por diferentes olhares,
independente de sexo ou gênero, como em “Cunilíngua”: coito/ minete/ (ou seria
minueto)? [...] quando abre flores e rosas para minha língua.
A
grandeza semântica exposta em Metáforas para um duelo no sertão também abre
espaço para uma boa disposição estrutural, mas sem muitas novidades. Neste
aspecto, chamam mais a atenção os poemas mais concisos, de versos livres, mas
não cansativos. A grande força dos poemas da coletânea ainda parece
estar mais na sensibilidade do poeta em criar belas e complexas imagens: com a
pele do olfato/ transbordando águas/ entre coxas, buracos e palato:
(“Condimento”). O resultado é um trabalho bem equilibrado que mostra toda a
maturidade de um bom poeta.
A quem se
deparar com esta obra, fica a certeza de textos bastante aprazíveis e de
ousadia e coragem. O poeta não anda em círculos, não corre atrás do próprio
rabo; uiva uma beleza nostálgica e serena, é leitura que trará boas sensações
ao leitor astuto que a buscar.
Wander
Shirukaya é escritor paraibano, autor do Blog do Shirukaya (http://blogdoshirukaya. blogspot.com.br/)
Este texto foi publicado no site Silêncio Interrompido (http://www. silenciointerrompido.com/).
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