quinta-feira, 25 de julho de 2013

“Visita à baleia”: um entrecruzar de prosa e poesia

Neide Medeiros Santos – Crítica literária FNLIJ/PB
            

            Nos romances como Moby Dick e O Velho e o Mar
            ou na história de Jonas
            o animal é algo nobre
            e  a vida
            - é um duelo  par-a-par.
            (Affonso Romano de Sant´Anna. A morte da baleia).

            O ensaio do jornalista Fernando Moura sobre o poema de Affonso Romano de Sant´Anna – “A morte da baleia”, publicado no “Correio das Artes” maio de 2013, Ano LXIV, No. 3 p. 4-16, nos levou ao encontro do livro infantil de Paulo Venturelli – “Visita à baleia” (Ed. Positivo, 2012), com ilustrações de Nelson Cruz. Os textos são bem distintos, mas o personagem é o mesmo – a baleia.

            Se no poema de Affonso Romano de Sant´Anna a denúncia aflora nos versos, na prosa poética de Paulo Venturelli é o encantamento que este animal desperta na mente das crianças.  Com “Visita à baleia”, Paulo Venturelli ganhou o Prêmio de Melhor Livro Infantil da FNLIJ em 2013 e a ilustração de Nelson Cruz foi Hors-Concours do Prêmio de Ilustração pela mesma Fundação.

              O espaço escolhido para a história é a cidade de Brusque, interior de Santa Catarina, não banhada pelo mar. Assim, quando o pai chegou com a notícia em casa de que havia uma baleia no centro da cidade, a mãe e os dois filhos ficaram com “os olhos arregalados até não mais poder” (2012: p.9). E veio o convite-ordem:
   
             “Vamos, vamos, Se aprontem que a gente vai até lá ver o bicho”. (p.9) 
   
          A mãe não acreditou em nenhum momento nessa história e dizia que era impossível aparecer uma baleia em uma cidade que não tinha mar, mas o pai e os meninos estavam curiosos para ver a baleia. Com roupa domingueira, partiram os três em direção ao centro. De bicicleta, seguiram para a grande festa. O pai no meio, o caçula na frente e o mais velho no bagageiro.  A mãe ficou em casa resmungando e duvidando da veracidade da história.

          O caminho da casa até o centro da cidade era acidentado, cheio de ladeiras e o menino mais velho, o narrador da história, fez muitas perguntas ao pai sobre a baleia, mas só encontrou respostas evasivas – a única coisa que ele sabia era que existia uma baleia no centro da cidade e que os colegas da fábrica estavam indo com a família para ver.
  
        Quando chegaram à praça, o menino viu a multidão e se arrependeu de ter vindo, poderia ter ficado em casa com a mãe, brincando com o Beto, era muito mais vantagem. Para piorar a situação, havia uma fila enooorme e que não caminhava, parecia que estava parada.  O desconforto da espera piorou quando o irmão menor começou a pedir “chovete” e ameaçava um choro para conseguir o que queria, mas o pai só pensava em ver a baleia e repetia: “Depois. Depois o pai compra.” (p.28).
         
     Enquanto esperava pelo momento ambicionado, o menino mais velho começou a relembrar fatos passados. Certa vez foi com o pai a um circo que apareceu na cidade. Pagaram ingresso para ver a “mulher barbuda”. Todos deviam passar bem depressa diante da mulher barbuda, o pai não gostou do engodo e gritou feio:
   
         “Cadê a lazarenta da barbuda? Aí no escuro, bem que pode ser homem. Bem que pode ser uma idiota com barba postiça” (p.32). Veio a pessoal do circo acalmar o homem que estava furioso. O menino sentiu-se envergonhado diante do escândalo do pai. Será que ele ia fazer o mesmo diante da baleia?

            A surpresa da história fica para o leitor do livro. Não quero desvendar o mistério que envolve a baleia. Seria uma baleia viva ou morta? Só lendo o livro para saber.

            No dia seguinte, quando foi à escola, a professora deu este tema para a composição: 

“Uma árvore frutífera”. O menino arriscou e perguntou à Dona Deolinda: “Posso fazer sobre a baleia?” (p.50). A professora não titubeou: “Deixa de ser bobo, menino. Escreva o que eu mandei”. (p. 50)

            O menino vai obedecer à ordem da professora? É outro segredo que está escondido no livro.   

             “Visita à baleia” é rico de imagens literárias, de devaneios, de entrecruzar de pensamentos, de linguagem coloquial bem descontraída.  Aliado a tudo isso, destacam-se as ilustrações de Nelson Cruz - sombrias, ternas, extravagantes, algumas minúsculas, outras grandiosas.  Contrastando com o preto de muitas páginas, aparece o azul celeste do céu e do carro “rabo de peixe” do doutor Nica.

            A respeito deste livro, o ilustrador Nelson Cruz assim se expressou: “Este livro Visita à baleia, do Paulo Venturelli, me concedeu o dom da invisibilidade. Explico. A maneira de narrar a história, como uma conversa ao pé do fogão, me envolveu desde o princípio. [...] Numa inversão, os personagens tornaram-se vivos e eu, invisível, acompanhei cena por cena até o desfecho e a lágrima final, que me trouxe de volta à realidade.” (Orelha do livro Visita á baleia).


            Tivemos a oportunidade de assistir, no 15º. Salão do Livro, Paulo Venturelli contar a história da baleia para crianças de escolas municipais e Nelson Cruz desenhá-la.  As crianças, muito atentas, pareciam não querer perder um só momento dessa aventurosa história. 

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