quinta-feira, 18 de julho de 2013

TATIANA BELINKY – “Sherazade das mil e uma histórias”

Por Neide Medeiros Santos – Crítica literária - FNLIJ/PB

            Capitu que me desculpe, mas a Emília é a maior heroína literária brasileira.
            (Tatiana Belinky)

            Tatiana Belinky nasceu em São Petersburgo, na Rússia, em 1919.  Quando completou um ano, a família se mudou para Letônia e por lá viveu até os dez anos. Em 1929, a família veio para o Brasil e a viagem de navio até o Rio de Janeiro (foram 21 dias de viagem) pareceu para aquela menina de 10 anos uma aventura semelhante às histórias que seu pai contava de longas viagens de navios, de guerras.
            
         O pai era um ator na arte de contar histórias, ele fazia uma voz diferente para cada personagem e foi ouvindo histórias contadas pelo pai que despertou na filha o gosto pelos livros. O desembarque foi no Rio de Janeiro, mas com poucos dias a família se transferiu para São Paulo e lá se fixou.
            
            Há um fato interessante na vida da estudante Tatiana Belinky. No colégio que estudou logo que chegou a São Paulo, as colegas riam por conta do seu sotaque estrangeiro e pela troca de palavras. Como não dominava bem a língua portuguesa, trocava palavras. O que fez a menina? Passou a estudar muito português e virou a melhor aluna de português da classe. Bendita vingança!
         
          Quando jovem, trabalhou como tradutora bilíngue, datilógrafa, só alguns anos mais tarde despertou para a literatura infantil. Casou com o médico e ator Júlio Gouveia, juntos montaram peças de teatro e fizeram a adaptação do Sítio do Picapau Amarelo para a TV Tupi de São Paulo.
            No livro autobiográfico, “Acontecências”, Tatiana transcreve inúmeros poemas de Júlio para sua amada. Aqui estão algumas dessas incursões poéticas do noivo:
       
          “Ofereço-te a fachada
            De um cantor tolo e pateta:
            Fez uma bruta “cantada”
            Numa Canção Indiscreta.”
            ***
            “De cantar, só, no meu canto
            Já estou a desencantar;
            Pro canto ter mais encanto
            Contigo quero cantar.”
     
           Esses poemas, endereçados à futura esposa, vinham sempre acompanhados de uma fotografia do autor dos versos.
    
          O interesse de Tatiana pela literatura infantil começou com o trabalho de adaptação da obra de Lobato para a TV. Seus livros infantis vêm marcados pelo humor, pelo tom de brincadeira. Inaugurou a série de “limeriques”, poemas de cinco versos, geralmente sobre coisas engraçadas.
  
           “A operação de tio Onofre” é um dos seus livros mais vendidos, já alcançou inúmeras edições. Com “Os dez sacizinhos”, Tatiana Belinky ganhou o prêmio de Melhor Livro Infantil em 1999, esse mesmo livro recebeu  o Prêmio de Melhor Ilustração Infantil.   Vários outros livros da autora receberam o selo “Altamente Recomendável” da FNLIJ.

          Em 2008, publicou “Limeriques da Cocanha” (Companhia das Letrinhas) com ilustrações bem jocosas de Jean-Claude Alphen.
            
              A Cocanha é um país imaginário, é o “São Saruê”, de Manoel Camilo dos Santos, mas este país imaginário de que nos fala Tatiana é bem anterior a São Saruê. Em nota explicativa, a autora nos diz que este país nasceu na fantasia de um anônimo poeta francês em plena Idade Média, lá pelos séculos XII ou XIII.
  
             Cocanha era uma terra de permanente felicidade, só existia lazer e ociosidade. Não havia ricos nem pobres, a comida já vinha pronta à mesa e fome lá também não existia.
   
         Vejam o primeiro limerique que descreve Cocanha:

            “ Na Cocanha a sociedade
            Vive em total liberdade –
            Lá ninguém trabalha
            (trabalho atrapalha...),
            Lá tudo é só felicidade.”

            Tatiana se foi, mas ficaram seus livros, limeriques, os contos russos traduzidos para português e um rico universo de livros infantis que a autora deixou para seus leitores.

            Heloísa Prieto, escritora e estudiosa da obra de Tatiana Belinky, considera que ela é a nossa “Sherazade das mil e uma histórias”, aquela que é capaz de manter viva a poesia da criança.  


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