Por Neide Medeiros Santos –
Crítica literária - FNLIJ/PB
Capitu que me
desculpe, mas a Emília é a maior heroína literária brasileira.
(Tatiana Belinky)
Tatiana Belinky nasceu em São Petersburgo, na Rússia, em
1919. Quando completou um ano, a família
se mudou para Letônia e por lá viveu até os dez anos. Em 1929, a família veio para
o Brasil e a viagem de navio até o Rio de Janeiro (foram 21 dias de viagem)
pareceu para aquela menina de 10 anos uma aventura semelhante às histórias que
seu pai contava de longas viagens de navios, de guerras.
O pai era um ator na arte de contar histórias, ele fazia
uma voz diferente para cada personagem e foi ouvindo histórias contadas pelo
pai que despertou na filha o gosto pelos livros. O desembarque foi no Rio de
Janeiro, mas com poucos dias a família se transferiu para São Paulo e lá se
fixou.
Há um fato interessante na vida da estudante Tatiana
Belinky. No colégio que estudou logo que chegou a São Paulo, as colegas riam
por conta do seu sotaque estrangeiro e pela troca de palavras. Como não
dominava bem a língua portuguesa, trocava palavras. O que fez a menina? Passou
a estudar muito português e virou a melhor aluna de português da classe.
Bendita vingança!
Quando jovem, trabalhou como tradutora bilíngue,
datilógrafa, só alguns anos mais tarde despertou para a literatura infantil.
Casou com o médico e ator Júlio Gouveia, juntos montaram peças de teatro e
fizeram a adaptação do Sítio do Picapau Amarelo para a TV Tupi de São Paulo.
No livro autobiográfico, “Acontecências”, Tatiana
transcreve inúmeros poemas de Júlio para sua amada. Aqui estão algumas dessas
incursões poéticas do noivo:
“Ofereço-te a fachada
De um cantor tolo e pateta:
Fez uma bruta “cantada”
Numa Canção Indiscreta.”
***
“De cantar, só, no meu canto
Já estou a desencantar;
Pro canto ter mais encanto
Contigo quero cantar.”
Esses poemas, endereçados à futura esposa, vinham sempre acompanhados
de uma fotografia do autor dos versos.
O interesse de Tatiana pela literatura infantil começou
com o trabalho de adaptação da obra de Lobato para a TV. Seus livros infantis
vêm marcados pelo humor, pelo tom de brincadeira. Inaugurou a série de
“limeriques”, poemas de cinco versos, geralmente sobre coisas engraçadas.
“A operação de tio
Onofre” é um dos seus livros mais vendidos, já alcançou inúmeras edições. Com
“Os dez sacizinhos”, Tatiana Belinky ganhou o prêmio de Melhor Livro Infantil em
1999, esse mesmo livro recebeu o Prêmio
de Melhor Ilustração Infantil. Vários
outros livros da autora receberam o selo “Altamente Recomendável” da FNLIJ.
Em 2008, publicou “Limeriques da Cocanha” (Companhia das
Letrinhas) com ilustrações bem jocosas de Jean-Claude Alphen.
A Cocanha é um país imaginário, é o “São Saruê”, de
Manoel Camilo dos Santos, mas este país imaginário de que nos fala Tatiana é
bem anterior a São Saruê. Em nota explicativa, a autora nos diz que este país
nasceu na fantasia de um anônimo poeta francês em plena Idade Média, lá pelos
séculos XII ou XIII.
Cocanha era uma terra de permanente felicidade, só
existia lazer e ociosidade. Não havia ricos nem pobres, a comida já vinha
pronta à mesa e fome lá também não existia.
Vejam o primeiro limerique que descreve Cocanha:
“ Na Cocanha a sociedade
Vive em total liberdade –
Lá ninguém trabalha
(trabalho atrapalha...),
Lá tudo é só felicidade.”
Tatiana se foi, mas ficaram seus livros, limeriques, os
contos russos traduzidos para português e um rico universo de livros infantis
que a autora deixou para seus leitores.
Heloísa Prieto, escritora e estudiosa da obra de Tatiana
Belinky, considera que ela é a nossa “Sherazade das mil e uma histórias”,
aquela que é capaz de manter viva a poesia da criança.
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