segunda-feira, 3 de setembro de 2012

Duelo entre o real e o imaginário no novo livro de Linaldo Guedes


 
Por Ronaldo Braga

A poesia de Linaldo Guedes é um grito carinhoso que continua mais forte no seu silencio, que nos pergunta o tempo todo sobre organização e alma, sobre vida e acordo, poesia que é um solapo em nossa quietude e ler “Metáforas para um duelo no sertão do poeta” Linaldo Guedes  nos permite um momento onde a quietude não é uma calmaria antes é uma necessidade de sobrevivência, pois é preciso depois da leitura fechar o livro e organizar o turbilhão de imagens, de buscas, de caminhos que de forma firme e duradoura ocupam nosso cérebro. 

Há e sempre houve muitos duelos no sertão, o sangue brota de peitos lacerados e cabeças erguidas, e o poeta  da Paraíba, nos revela um outro duelo dentro de todos os duelos sertanejos, o duelo que marca a fronteira entre o real e o imaginário, entre a escolha e o imposto, entre o ser e o nada, um duelo travado na fome que não nos devora e sim nos impulsiona como fortes para caminhar entre espinhos e sedes, a fome que  é o caminhar,  o viver entre nuvens de ideias e poucas certezas, a fome que nos mantém vivos.

É, portanto, desta fome que trata o livro do poeta Guedes, uma fome bela e que no sertanejo às vezes coberta como poeira por outras fomes pode nos aparentar fracos ou mesmo vitimas. E  a poesia de Linaldo não tem  a dor do fracasso ou da vingança, mas a serenidade da percepção que a vida sofre mas também é uma festa, é uma espera e é sempre uma luta dentro de muitas outras lutas. 

"meu pai sorriu
à sombra da goiabeira

nada de rugas na face
apenas a névoa
de um tempo escondido pela sombra das horas."

O passado na figura do pai é de uma melancólica e doce  lembrança, não no sofrimento, mas na névoa que reescreve o rosto na falta de rugas e numa sombra, a da goiabeira, uma outra faz suave e sábio o nosso existir, o das horas.

E enfrentando a religião sem raivas e sem medos ele afirma:

"matraca silenciosa
liturgia de augusto
remoendo
moendo
doendo
moenda
- bagaço de homem no altar dos sertões".

E o poeta Linaldo Guedes brinca com sua infância, seu crescer, sua família e entre alegrias e descobertas ele afirma a sadia desavença entre idades e sexos no ninho, que é um pouco revelado na sombra da goiabeira, salta agora em Lili, em Deci, Didi, Laura, em Laudeni, na galega Neném e se junta na rede com o pai, embalado em natais onde a família tocaiava sonhos de olho no alpendre, pois sabedor que 

"liturgia de oração
- negação do jejum do prazer"

Linaldo declara:

"nunca conseguira entender a falta de pão"

Pois é com poesia que o poeta enfrenta dores e calúnias

"sou um homem marcado
marcado para doer
gado preso no curral
quando não, abatido
comendo Baudelaire
na erva daninha de meu capim."

E continua caminhando por entre fantasmas  nas brincadeiras de muitas humanidades, fazendo duelar os medos dos 12 anos, bumba meu boi  e sombras na parede, com a dura realidade do homem quarentão que nada teme, mas

"tanto medo aos 12
aos 40, medo só de seu olhar de graúna"

Linaldo Guedes não vive por ai afirmando sua sertanidade, antes universal sabe das necessidades de superar mitos e vencer etapas 

"cansei de pasárgada
este negócio de sentar-se eternamente no trono
não compensa a mulher que queremos"

Podemos então arriscar que “Metáforas para um duelo no sertão” do poeta paraibano LINALDO GUEDES, publicação da editora Patuá é não um mergulho no próprio umbigo do poeta, mas sim a afirmação da vida com toda a dor e o prazer que tem no fato de viver e que também soa este livro como uma canção que pode ser  um grito forte saudando nossas fomes e um esperançoso desejo de duelar.

Recomendo a leitura de “Metáforas para um duelo no sertão”, que com certeza vai abrir horizontes e permitir o deleite do belo numa terra árida e fazer plainar azedumes em dias de fugas, Um livro com um coração repleto de amores e fomes e sempre um coração decidido.

Ronaldo Braga é poeta baiano.

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