quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

De Cleonice Berardinelli: Fechamento da Livraria Camões, no Rio de Janeiro

Repassando!
Senhor Dr. Estêvão de Moura,
Presidente do Conselho de Administração da Imprensa Nacional - Casa da Moeda S.A.

Prezado Senhor:

        Na qualidade de decana dos Estudos Portugueses no Brasil (licenciada em 1938, na Universidade de São Paulo - USP), lamentando profundamente o fechamento  das atividades da Livraria Camões, o último reduto, no Rio de Janeiro, da aquisição de livros de Portugal, e, pois, dos últimos em que se preserva e divulga  uma cultura tão próxima de nós, expressada na mesma língua, cabe-nos a nós, professores universitários de Literaturas de Língua Portuguesa -- para os quais o livro português é instrumento de trabalho --, buscar a possibilidade de se revogar tão drástica decisão,  participando  efetivamente das medidas que se tornarem possíveis.

         Atenciosamente,
Cleonice Berardinelli
Professora Emérita de Literatura Portuguesa das Universidades
Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e Pontifícia Universidade Católica do Rio (PUC-Rio)
Membro da Academia Brasileira de Letras (ABL)


Saiba mais sobre o fechamento e a livraria


RIO - São apenas 75 metros quadrados, mas suficientes para abrigar Portugal. Ou, pelo menos, uma parte representativa de Portugal. É a Livraria Camões, no Shopping Avenida Central, no Centro do Rio, aberta em novembro de 1972 e frequentada por escritores, professores, pesquisadores, estudantes e entusiastas da cultura e da literatura portuguesa.

Agora, quase 40 anos depois, ela vai fechar as portas no dia 31. O anúncio vem mobilizando intelectuais no Brasil e em Portugal, que, por meio do Facebook (com a comunidade "A Livraria Camões é patrimônio do Rio de Janeiro"), do YouTube e de um abaixo-assinado, lutam para impedir a decisão.

Perplexidade em Portugal

Escritores como Maria Teresa Horta, Manuel Alegre e José Manuel Mendes criticam o "ato deplorável" que atinge "o valor estratégico que é a difusão da língua e cultura portuguesas". O secretário-geral do Partido Socialista português, António Jose Seguro, demonstrou "perplexidade". O partido, por sua vez, insurgiu-se contra a medida na Assembleia da República.

Gerente da livraria, José Estrela foi comunicado da determinação no dia 6 por uma carta assinada por Estêvão de Moura, presidente da Imprensa Nacional (INCM), editora que mantém a Camões.

- Estou vivendo minha segunda viuvez - lamenta Estrela, que há 25 anos perdeu a mulher num acidente de carro. - Mas jamais imaginaria que tanta gente admirasse o trabalho que fiz nesses 40 anos. Tenho recebido mensagens de carinho de todas as partes. Isso me dá uma alegria que paga todo o sofrimento que eu possa ter agora.

Na carta, Estêvão de Moura diz que a "evolução tecnológica, social e cultural verificada ao longo deste tempo, com especial evidência nas duas últimas décadas, fez evoluir o contexto em que se inscreve a missão com que a Livraria Camões foi inicialmente constituída". Além disso, os obstáculos "associados ao transporte e comercialização de livros e a representação da INCM numa única livraria no vasto território brasileiro limitaram fortemente a divulgação das nossas obras no Brasil e comprometeram irremediavelmente a situação econômico-financeira" da Camões.

À agência Lusa, o diretor de marketing estratégico da INCM, Alcides Gama, acrescentou que hoje é possível para a livraria prestar o mesmo serviço, de forma mais eficaz, por meio das novas tecnologias. A professora Gilda Santos, da UFRJ, rebate:

- Nosso pasmo é que, enquanto as editoras Leya e Babel estão entrando com toda força no Brasil, a Imprensa Nacional diz que a Camões está obsoleta. Por que então não a transformam num centro de encomendas via internet? Por que não manter o espaço e reinventar formas de o dinamizar?

Maior especialista em literatura portuguesa do país, a acadêmica Cleonice Berardinelli escreveu para Estêvão lamentando o fechamento do "último reduto, no Rio, da aquisição de livros de Portugal" e buscando a possibilidade de se revogar "tão drástica decisão".

Acordo cultural

A Camões foi aberta como parte de um acordo cultural entre os dois países. De lá para cá, virou ponto de referência.

- Chegamos a ter 114 editoras portuguesas representadas. Ela é o pedacinho de Portugal mais perto dos brasileiros. É aqui que se viam as produções mais recentes, que as pessoas bebiam as novidades - diz Estrela. - Importamos dois milhões de livros portugueses. E, somente de 1984 a 1986, vendemos 200 mil exemplares. Ela é pequena, mas era daqui que atingíamos o Brasil inteiro.

Estrela percorreu todos os estados com os vendedores.

- Saíamos de ônibus e andávamos horas até, por exemplo, Belém do Pará. Chegávamos de madrugada e tínhamos que esperar o comércio abrir. Dormíamos nas estações rodoviárias com as malas amarradas às pernas para ninguém levar.

Essa espécie de pequena Portugal era palco de lançamentos de autores como Lídia Jorge e Augustina Bessa. Foi lá que a sobrinha-neta de Ofélia, namorada de Fernando Pessoa, lançou "Cartas de amor", do poeta.
- Foi aqui que José Saramago lançou seu primeiro livro no Brasil - lembra Estrela, nascido na aldeia de
Pardilhó, no distrito português de Aveiro.

No Facebook, a ensaísta, crítica literária e professora portuguesa Maria Alzira Seixo lembra o que Saramago dizia do gerente: "O Estrela é Portugal no Brasil. Instiga os brasileiros a comprarem os nossos livros - mas a nós, que sabe que os lemos e temos, quer é nos mostrar a maravilha que é o Brasil. Este homem é um achado, um grande divulgador da cultura portuguesa através do livro, e um cultor das relações Portugal-Brasil."

Nos últimos tempos, a Camões vinha enfrentando prejuízos. Em 2011, ela não importou um único livro.
- Lisboa não mandava - explica ele. - As vendas então caíram muito.

De cinco anos para cá, o que era comercializado não dava para pagar as despesas de 35 mil mensais. Os 18 empregados diminuíram para cinco.

Com o iminente fechamento, ele ainda não sabe o que fazer.
- Vou viver meus últimos anos. Talvez continue com livros - diz, aos 76 anos.

Sobre os livros da Camões, vai vendê-los "para quem quiser" comprar, sejam particulares, bibliotecas, livrarias ou universidades.

fonte: yahoo notícias


2 comentários:

  1. Uma pena. Uma livraria fechada sempre me entristece. Quando morava em Natal, tive oportunidade de ver uma livraria fechando e, apesar de ter comprado livros a preço de banana, fiquei com o coração partido por saber que nunca mais passaria algumas boas horas entre aquelas estantes.

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  2. Sempre é, Denser. E quando falamos de uma tão especial como a camões, capaz de mobilizar tanta gente, a coisa parece mais triste.
    abraço

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